A Europa lançou um proposta de regulamento controversa sobre o repatriamento na UE que apresenta os centros de repatriamento fora da UE como medidas inovadoras para reduzir a migração irregular.
A Europa pretende reduzir a migração irregular e acelerar o processo de repatriamento das pessoas cujo pedido de asilo tenha sido rejeitado. Tendo isto em conta, a Comissão Europeia propôs um Sistema Europeu Comum de Repatriamento. Atualmente, as taxas de repatriamento rondam os 20 por cento, um valor considerado insuficiente pela presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen.
A proposta inclui a possibilidade de criar centros de repatriamento em países terceiros, com base em acordos celebrados bilateralmente ou a nível europeu. No entanto, a aplicação e a viabilidade jurídica de tais acordos continuam a ser complexas. O protocolo Itália-Albânia é um exemplo disso.
Em 2023, Roma e Tirana am um acordo para a criação de dois centros inicialmente destinados a acolher os requerentes de asilo não vulneráveis provenientes dos chamados "países seguros" e resgatados em águas internacionais. Os tribunais italianos bloquearam o processo por três vezes devido a questões jurídicas e constitucionais. Roma decidiu então acrescentar novas funções a estes centros, que já começaram a ser utilizados como centros de repatriamento para as pessoas cujo pedido de asilo foi rejeitado. Mais de 100 organizações de direitos humanos de toda a Europa alertaram para o facto de a externalização das políticas de migração poder resultar num padrão preocupante de violações dos direitos humanos.
Itália e a externalização dos procedimentos de asilo: o caso de Moetaz
A cerca de trinta quilómetros a norte de Nápoles, encontra-se o pequeno município de Parete, situado numa região conhecida pela agricultura e pela migração, para o qual muitos migrantes se dirigem em busca de trabalho. Moetaz, egípcio e requerente de asilo, tencionava reunir-se com o pai em outubro de 2024. O pai, Atef (61), veio para Itália há 20 anos. Moetaz, de 28 anos, atravessou o Mediterrâneo vindo da Líbia, onde diz ter sido detido e torturado. Depois de ter sido resgatado em águas internacionais, tornou-se um dos primeiros requerentes de asilo enviados pela Itália diretamente para um centro de acolhimento na Albânia.
"Estava a uns meros 200 metros da praia de Lampedusa", disse Moetaz. "Um tradutor disse-nos que íamos ser transferidos para a Albânia. Disse: 'Agora, irá pedir asilo. Se for aceite, irá para Itália. Se não for aceite, o seu caso irá ser analisado e resolvido com expulsão ou prisão.'"
Moetaz ficou na Albânia apenas uma semana. O Tribunal de Roma rejeitou a detenção, declarando que era impossível reconhecer o país de origem de Moetaz como "seguro". O caso de Moetaz expôs as falhas de todo um sistema que visa externalizar a gestão dos requerentes de asilo em Itália, uma questão que está agora a ser abordada pelo Tribunal de Justiça Europeu.
O advogado de Moetaz considera que os procedimentos acelerados para os migrantes considerados "não vulneráveis" e provenientes dos chamados "países seguros" violam a Constituição italiana.
"Do ponto de vista dos direitos humanos, deter uma pessoa num país terceiro, que hoje é a Albânia, mas amanhã pode ser a Tunísia, o Níger ou outro país, significa negar-lhe a possibilidade de exercer os seus direitos fundamentais", afirmou Gennaro Santoro, advogado de Moetaz. "Mesmo estando o meu cliente na Albânia, que fica a dois os de Itália, não consegui entrar em o com ele antes da audiência. Só durante a audiência é que descobri que ele tinha sido torturado na Líbia e que estava a fugir do Egito devido a perseguições."
Tobé: "O projeto de regulamento da UE sobre os repatriamentos difere do protocolo Itália-Albânia"
Apoiante da proposta de regulamento da UE sobre os repatriamentos, Tomas Tobé, vice-presidente do Grupo do Partido Popular Europeu, distanciou-se do protocolo Itália-Albânia. Tobé explicou que a proposta europeia visa recorrer aos centros de repatriamento apenas para as pessoas cujos pedidos de asilo já tenham sido rejeitados. Tobé defendeu a necessidade de cooperação com países terceiros fora da Europa:
"Não estou a dizer que é fácil. Não somos nós que escolhemos os vizinhos da Europa. Ouço muitas críticas vindas da esquerda, mas também da extrema-direita, que afirmam, basicamente, que não deve existir qualquer cooperação. Mas assim também não há solução."
Tobé sublinhou que as pessoas que têm direito a asilo na Europa devem ser protegidas e que as decisões de recusa devem ser aplicadas de forma eficaz.
Em 2018, a Comissão Europeia declarou que os centros de repatriamento situados no exterior eram ilegais. Os críticos argumentam que, atualmente, conceitos outrora associados à extrema-direita estão a ser integrados com mais frequência na política geral da UE.