Um novo projeto de lei apresentado na sexta-feira em Budapeste permitirá ao Serviço Nacional de Eleições da Hungria revogar os mandatos dos deputados do Parlamento Europeu se estes não cumprirem as regras de transparência financeira.
Um projeto de lei apresentado na sexta-feira à noite pelos deputados da coligação governamental húngara Fidesz-KDNP reforça as regras de transparência para os eurodeputados e ameaça atingir o líder da oposição, Péter Magyar, segundo o próprio Magyar e um comentador político.
Se for aprovada, a nova lei exigirá que todos os eurodeputados húngaros revelem os seus ativos financeiros de forma semelhante à dos seus homólogos no Parlamento húngaro.
Mas a nova lei, tal como está redigida, também estipula que os eurodeputados que não cumpram as novas obrigações de transparência poderão ver os seus mandatos revogados pelo Gabinete Nacional de Eleições (NEO). O presidente do Gabinete Nacional de Eleições deverá enviar uma carta à presidente do Parlamento Europeu, notificando-a da revogação do mandato do deputado.
Péter Magyar afirma que as medidas são dirigidas a ele
O processo parece ter sido concebido a pensar em Péter Magyar, que fundou há um ano o partido da oposição Tisza. Numa publicação no Facebook, no fim de semana, dirigida a Orbán, escreveu: "Ouvi dizer que está a ficar cada vez mais nervoso e que entregou aos seus bobos da corte a tarefa de encontrar uma arma milagrosa que me possa realmente tirar do caminho".
Sondagens recentes sugerem que a popularidade de Tisza e Magyar está a aumentar antes da disputa com o primeiro-ministro Viktor Orbán nas eleições gerais previstas para o próximo ano. De acordo com uma sondagem realizada pela Median e publicada em março, Tisza está à frente do Fidesz por 9%.
O analista político Szabolcs Dull afirmou, num boletim semanal, que o momento e o conteúdo do projeto de lei indicam que este é dirigido a Péter Magyar.
Dull salientou o facto de o projeto de lei prever o mecanismo de revogação apenas para os deputados europeus e não para os deputados nacionais. O facto de já ter sido instaurado um processo por abuso de informação privilegiada contra Péter Magyar indica que este é o alvo provável da lei.
Dull disse à Euronews que o objetivo da nova lei não é revogar o mandato de Magyar ou impedi-lo de concorrer às eleições do próximo ano, mas sim prejudicar a sua imagem pública.
"Querem manter na ordem do dia o facto de haver alguma confusão à volta de Péter Magyar e de haver um escândalo em torno da forma como ele enriqueceu, da sua riqueza. O Fidesz mede as pontuações de idoneidade do primeiro-ministro todas as semanas e quer construir a narrativa de que o desafiador do experiente primeiro-ministro está envolvido num escândalo", de acordo com Dull. A Euronews ou o partido Fidesz para comentar o assunto.
Acusações de abuso de informação privilegiada
Em fevereiro, a Procuradoria Central de Investigação iniciou uma investigação sobre uma alegada transação na bolsa de valores efetuada por Péter Magyar em 2013. Na altura, Magyar era um aliado próximo do partido Fidesz de Viktor Orbán. Os meios de comunicação social húngaros noticiaram que Magyar lucrou vários milhões de forints húngaros com a venda de uma participação na Opus, uma empresa relacionada com o homem mais rico da Hungria, Lőrinc Mészáros, poucas horas antes de Mészáros anunciar uma campanha de recompra de acções, fazendo subir significativamente os preços. Magyar negou categoricamente as alegações, descrevendo-as como totalmente falsas, e disse ao diário húngaro HVG que geralmente perdia dinheiro em transações na bolsa, e que tem dados bancários que mostram que as datas das transações não correspondem às alegações.
Questões jurídicas sobre as novas disposições
De acordo com o especialista em direito comunitário Tamás Lattmann, nunca na história do Parlamento Europeu um deputado europeu viu o seu mandato revogado por um Estado-membro. O direito nacional não pode prevalecer sobre o direito comunitário e os mandatos dos deputados europeus não podem ser revogados desta forma.
"Mesmo que a autoridade nacional, o NEO, decida retirar o mandato a um deputado europeu, o Parlamento Europeu pode simplesmente ignorá-lo, uma vez que o mandato não se baseia na decisão do gabinete eleitoral", afirmou Lattmann. O eurodeputado acrescenta que qualquer decisão deste tipo pode ser contestada por qualquer eurodeputado sujeito a essa decisão, o que poderá resultar numa longa batalha legal que culminará na Cúria da Hungria ou, eventualmente, no Tribunal de Justiça Europeu.
Um porta-voz do Parlamento Europeu recusou-se a comentar as propostas legislativas nacionais que ainda se encontram em fase de projeto.
Magyar responde com um desafio a Orban
No fim de semana, Magyar reagiu aos planos com uma publicação no Facebook dirigida a Orban, na qual manifestava a sua intenção de cumprir os requisitos e desafiava o titular do cargo a seguir o exemplo.
"Não só vou declarar publicamente os meus bens, como também os dos meus familiares. Podem seguir-me! Vamos baixar as calças juntos, primeiro-ministro! Está combinado?", lê-se no post.
No post, Magyar também criticou Orbán por alegadas posses de luxo, como um jardim zoológico privado com zebras e paisagens no valor de 30 milhões de HUF (75.000 euros) na propriedade de Orbán em Hatvanpuszta. Um porta-voz do Governo disse que as alegações eram "desprovidas de humor".