Cardeal madeirense está na lista restrita de 22 candidatos elaborada pelos especialistas, mas é improvável que venha a suceder a Francisco, diz à Euronews o padre José Manuel Pereira de Almeida. "A minha ideia é que a escolha não irá recair num cardeal europeu", adianta.
A morte do Papa Francisco intensificou o debate no espaço público e lançou um frenesim nas casas de apostas sobre quem será escolhido para ocupar o cargo de topo da Igreja Católica Romana, ramo maioritário do Cristianismo com mais de 1.300 milhões de fiéis em todo o mundo.
Entre os 136 cardeais que vão escolher o futuro Papa, isto é, cardeais com menos de 80 anos, requisito imposto pelas atuais normas da Igreja, quatro são portugueses: D. Manuel Clemente, patriarca emérito de Lisboa; D. António Marto, bispo emérito de Leiria-Fátima; D. José Tolentino de Mendonça, prefeito do Dicastério para a Cultura e Educação, e D. Américo Aguiar, bispo de Setúbal.
Tolentino de Mendonça, de 59 anos, o mais jovem entre os apontados como candidatos à liderança do Vaticano, foi criado cardeal pelo Papa Francisco em 2019, já depois de Manuel Clemente (2015) e António Marto (2018), mas, dos portugueses, é o candidato mais forte a sentar-se na Cadeira de São Pedro, estando mesmo no seleto lote de 22 cardeais considerados papabili (em italiano) pelos especialistas do Cardinalium Collegii, ou seja, cardeais com condições para chegar a Papa. Esta plataforma online reúne uma equipa internacional e independente de prestigiados jornalistas e investigadores católicos que dão informação sobre os principais candidatos, embora ressalve que não faz prognósticos sobre quem poderá ser o próximo pontífice.
Em Portugal, o entusiasmo com a hipótese de Tolentino de Mendonça vir a chefiar a Igreja Católica tem crescido nos últimos tempos, mas o padre José Manuel Pereira de Almeida, vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa e que conhece bem o cardeal madeirense, põe água na fervura.
"É improvável", diz o padre à Euronews, ao mesmo tempo que aposta num rosto de fora da Europa.
"A minha ideia é que a escolha não irá recair num cardeal europeu, por causa da evolução que a própria Igreja Católica tem tido nos outros continentes, como em África e na Ásia", explica.
Em 2013, quando Francisco foi eleito Papa após a renúncia de Bento XVI, os cardeais eleitores da Europa representavam 56% do total, mas as escolhas do pontífice argentino deram mais peso a África, à Ásia e à Oceânia, que até então só contavam com 22 cardeais eleitores na soma dos três continentes. Jorge Mario Bergoglio nomeou mais de três quartos dos cardeais que dentro de 15 a 20 dias se vão juntar na Capela Sistina para, à porta fechada e de forma secreta, elegerem o novo Papa.
A relação de forças no próximo conclave garante maior diversidade geográfica, com a Europa a constituir agora 39% do total - há 53 eleitores do velho continente, 37 da América, 24 da Ásia, 18 de África e quatro da Oceânia. Segundo a Agência Ecclesia, estarão representadas 73 nações no conclave, contra apenas 49 em 2013, sendo que os países com mais eleitores são a Itália (17), Estados Unidos da América (10), Brasil (7), Espanha, França e Índia (5 cada), configurando mais de um terço do total.
"Não me iraria se o próximo Papa viesse de um outro continente que não da Europa", reitera Pereira de Almeida.
Demasiado moderno e progressista?
É bem conhecido o ditado italiano, segundo o qual, “quem entra Papa no conclave sai cardeal”, o que poderia jogar a favor de Tolentino de Mendonça, visto como possível candidato à sucessão de Francisco mas sem estar nas principais cogitações de especialistas e apostadores.
Só que, além do fator geográfico, há uma outra máxima que reduz ainda mais as chances do cardeal luso. Apregoa-se no Vaticano que “a um Papa gordo deve seguir-se sempre um magro”, o que vale por dizer que a um reformador deve seguir-se um conservador.
Tolentino, lembra a equipa do Cardinalium Collegii, tem criado bastante controvérsia durante a sua vida sacerdotal, em especial pelas abordagens tidas como heterodoxas e tolerantes face à homossexualidade, apesar de o cardeal de Machico nunca se ter manifestado de forma pública contra os ensinamentos da Igreja a este respeito.
Além disso, não zelou pela sua popularidade quando se aliou a uma irmã beneditina feminista que promove oaborto, a ordenação de mulheres, o "casamento" entre pessoas do mesmo sexo e a adoção de crianças por casais homossexuais.
"Para a tradução nacional, [Tolentino de Mendonça] é o ministro da Educação e da Cultura, o que quer dizer que tem sob a sua tutela as universidades católicas no mundo, os aspetos culturais e mais significativos das Conferências Episcopais, e portanto é um homem muito bem cotado, no sentido em que é muito considerado, muito escutado", realça o padre Pereira de Almeida.
Tolentino de Mendonça, que em meados de fevereiro até já presidiu a uma missa dominical no Vaticano em substituição de Bergoglio, então internado no hospital, tem prestígio nos corredores da Santa Sé e era muito próximo de Francisco, mas as suas posições liberais na tentativa de modernizar a Igreja talvez sejam mais um obstáculo do que uma vantagem.
Em dois milénios de Cristianismo, João XXI foi o único Papa português. Era um médico natural de Lisboa que teve um pontificado de menos de um ano entre setembro de 1276 e maio de 1277.