Com os políticos a centrarem-se na pobreza na terceira idade, muitos apelam ao Governo alemão para que reforme o sistema de pensões. Mas qual é a gravidade da situação?
Com os partidos políticos Alternativa para a Alemanha (AfD) e Aliança Sahra Wagenknecht (BSW) a prometerem mais dinheiro para os pensionistas, as aposentações tornaram-se um tema quente na Alemanha antes das eleições federais do próximo ano.
O governo de coligação também se viu em apuros políticos, depois de o Ministro das Finanças, Christian Lindner, ter anunciado planos para alterar as pensões privadas no início de 2024, alguns anos depois de ter eclodido uma agitação significativa em França, quando o presidente Emmanuel Macron introduziu legislação para aumentar a idade legal da reforma.
Qual é a realidade atual dos reformados na Alemanha?
A Euronews falou com a reformada berlinense Antje, de 65 anos, que trabalhou durante 45 anos como cuidadora sénior num lar para idosos. Antje diz que recebe uma pensão do Estado de 1500 euros por mês, depois de deduzidos os impostos e o seguro de saúde.
Antje considera-se afortunada por ter herdado a riqueza da família, mas reconhece que “é difícil para as pessoas de diferentes origens que podem não ter tido a mesma educação ou oportunidades dos seus pais. É difícil para elas progredir”.
Antje afirma que é importante que as pessoas garantam o seu plano de reforma cedo, “para não terem de depender de outra pessoa para cuidar de si ou para lhe dar oportunidades”, e já aconselhou o seu filho a diversificar o seu património com investimentos.
Quando questionada sobre a pobreza entre os idosos, Anje referiu o tempo em que trabalhou num lar de idosos. “Reparei que as pessoas idosas que são colocadas em lares ou que ficam a cargo dos seus familiares têm frequentemente muito pouco dinheiro. Muitos deles têm apenas uma pequena quantia de rendimento disponível por mês e estão a ar por dificuldades”.
Antje explica que estas pessoas continuam a ser cuidadas, mas são frequentemente obrigadas a depender do que podem receber da segurança social. “Algumas delas não ganharam muito ao longo da vida, ou tiveram muitos filhos, trabalharam como donas de casa e nunca tiveram um emprego remunerado. Muitas vezes sentem-se um pouco tristes ou arrependidas por isso”, diz, acrescentando que essas pessoas podem acabar por se sentir abandonadas pelo Estado.
A reformada explica que não eram só as pessoas de quem cuidava no trabalho que tinham dificuldades, eram também os seus colegas, muitos dos quais têm de continuar a trabalhar até à reforma porque simplesmente não ganham o suficiente.
“Apesar da sua idade, continuam a trabalhar porque as suas pensões não são suficientes. Isso é muito difícil”, explica.
O que é que o sistema de pensões alemão oferece?
Una Großman é porta-voz do Seguro de Pensões Alemão (DR), a organização que reúne os fundos de pensões alemães. Segundo ela, cerca de 21 milhões de pessoas recebem uma pensão. O montante médio bruto da reforma, após 35 anos de contribuição para o sistema, é de 1 620 euros por mês, sujeito a deduções fiscais e ao seguro de doença.
Großmann afirma que entre os 21 milhões de pessoas que recebem pensões, apenas “uma minoria continua a trabalhar depois da reforma”, cerca de 1,3-1,4 milhões de pessoas. Acrescenta que 80% das pessoas empregadas têm um “mini-emprego”, ou seja, um emprego a tempo parcial. Apenas cerca de 270 mil têm um emprego mais significativo.
“As razões para trabalhar na velhice variam muito e são muito pessoais”. Großman explicou, citando um estudo de 2022 que analisou os hábitos de trabalho dos idosos. “A descoberta mais surpreendente foi o facto de a razão número um para as pessoas continuarem a trabalhar na velhice ser o gosto pelo trabalho”.
“Menos de metade das pessoas citaram razões financeiras como o principal fator”, concluiu.
O sistema de pensões alemão pode ser melhorado?
Großmann faz questão de sublinhar que a pensão legal alemã está indexada à inflação salarial. Este ano, houve um aumento de 4,57% em toda a Alemanha para todos os reformados.
“Existe também uma garantia de pensão, o que significa que os pagamentos de pensões não podem descer abaixo de um determinado nível, mesmo no caso hipotético de uma inflação salarial negativa”, afirma.
A porta-voz do DR advertiu que o sistema de pensões alemão está num período de transição e que “as pensões serão cada vez mais tributadas no futuro”.
No entanto, ela também celebra o sistema, argumentando que ele permite que as pessoas mais velhas tenham a oportunidade de se reformar em paz, depois de terem trabalhado durante várias décadas. “Também vejo o aumento da longevidade como um sucesso... não deveríamos estar todos orgulhosos por termos criado um sistema em que a longevidade, uma vida longa e saudável, é possível?”, afirma.
Os peritos financeiros têm lançado dúvidas sobre a eficácia do sistema de pensões na Alemanha e os jovens estão preocupados com o seu o às pensões à medida que a idade da reforma aumenta em países europeus como a França e a Alemanha.
Großmann reconhece a mudança demográfica, “não só na Alemanha, mas também noutros países europeus. Este facto já é conhecido há muito tempo. É um desafio para o sistema de pensões alemão, mas atualmente não é tão grave como inicialmente previsto”.
A Alemanha anunciou que a idade de reforma aumentará para 67 anos até 2031, ando gradualmente dos atuais 64,4 anos. Embora o DR concorde com este aumento, chama a atenção para a necessidade de o equilibrar com a continuação das oportunidades de emprego.
“Se é suposto as pessoas trabalharem mais tempo, tem de haver um ambiente de trabalho adequado para o fazerem”. Com o desenvolvimento da IA a uma velocidade vertiginosa, a preocupação entre as gerações mais jovens continua a aumentar.
O que é que as pessoas podem fazer?
Großmann repete o conselho de Antje ao seu filho: não ponha todos os ovos no mesmo cesto.
Desde 2001, a Alemanha adoptou o chamado “modelo de três pilares” para o rendimento da reforma. “Isto significa que não há apenas a pensão legal, mas muitas pessoas também têm rendimentos de outras fontes. Os três pilares são: primeiro, a pensão legal; segundo, os planos de pensões privados; e terceiro, os planos de pensões da empresa”, explica.
Muitas vezes, estes rendimentos são também complementados por rendimentos privados provenientes de investimentos em acções e imóveis. “Quando se pensa no rendimento da reforma mais tarde, é importante ter em conta o contexto familiar e não se concentrar apenas na pensão legal”, conlui.
No entanto, como a idade média na Alemanha e em todo o continente continua a aumentar e a taxa de natalidade a diminuir, parece que, de uma forma ou de outra, serão necessárias reformas, quer através do aumento da idade da reforma, quer através de uma maior afetação de verbas do orçamento federal às futuras pensões.
Esta questão poderá tornar-se o tema político decisivo de uma geração.