{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/my-europe/2016/10/13/mutilacao-genital-feminina-o-crime-do-qual-muito-poucos-falam" }, "headline": "Mutila\u00e7\u00e3o genital feminina: O crime do qual muito poucos falam", "description": "Cerca de 200 milh\u00f5es de mulheres j\u00e1 foram v\u00edtimas de mutila\u00e7\u00e3o genital. O Insiders apresenta relatos in\u00e9ditos de quem decidiu travar a vontade da fam\u00edlia.", "articleBody": "O seguinte dado n\u00e3o deixa de parecer inconceb\u00edvel nos dias que correm: segundo um relat\u00f3rio da Unicef, cerca de 200 milh\u00f5es de mulheres no mundo inteiro foram v\u00edtimas de mutila\u00e7\u00e3o genital. O Insiders apresenta relatos in\u00e9ditos de quem decidiu travar a vontade da fam\u00edlia e terminar abruptamente a adolesc\u00eancia contra tudo e todos \u00e0 sua volta. Uma reportagem da autoria de Damon Embling. \u201cFui amarrada, afastaram-me as pernas e senti que havia um objeto afiado. Na altura, nem sequer entendi o que estavam a fazer, senti apenas que estavam a tentar cortar algo das minhas partes \u00edntimas. Foi um choque quando percebi. Nunca me ou pela cabe\u00e7a que a minha pr\u00f3pria fam\u00edlia pudesse organizar uma tamanha viol\u00eancia contra mim.\u201d O relato \u00e9 de Sarian Karim Kamare, de 39 anos. Vive em Londres, onde tem um supermercado. Com apenas 11 anos, os seus \u00f3rg\u00e3os genitais externos foram removidos com uma faca, sem qualquer anestesia. Tudo aconteceu na Serra Leoa, o seu pa\u00eds natal. Captured and cut: #FGM returns to Sierra Leone despite ban, highlighting the challenges facing anti-FGM campaigners https://t.co/p0wMEt0ppw\u2014 Sarah Hyde (@SazBN1) 30 septembre 2016 \u201cEles fazem-nos isso como forma de nos integrar na comunidade e porque faz parte da cultura. Mas n\u00e3o est\u00e1 escrito em nenhum dos livros sagrados. Eles adotaram uma pr\u00e1tica cultural que est\u00e1 errada. Submetem as mulheres a uma dor devastadora para as controlar, sobretudo as suas puls\u00f5es sexuais. E funciona. Destr\u00f3i completamente o nosso apetite sexual\u201d, conta-nos. Para al\u00e9m das consequ\u00eancias f\u00edsicas, o stress p\u00f3s-traum\u00e1tico \u00c9 dif\u00edcil apurar a verdadeira dimens\u00e3o do fen\u00f3meno da mutila\u00e7\u00e3o genital feminina. A vergonha e o medo impedem que muitas das hist\u00f3rias venham a p\u00fablico. No Reino Unido, as estimativas rondam as 170 mil mulheres e raparigas j\u00e1 sujeitas a esta pr\u00e1tica. A maior parte ter\u00e1 sido submetida \u00e0 excis\u00e3o nos pa\u00edses de origem. A Som\u00e1lia, a G\u00e2mbia e o Sud\u00e3o est\u00e3o no topo da lista. Oficialmente, os servi\u00e7os de sa\u00fade brit\u00e2nicos detetam uma m\u00e9dia de 100 casos por semana. A m\u00e9dica Brenda Kelly dirige a Rose Clinic em Oxford, especializada nos diversos problemas de sa\u00fade que este tipo de mutila\u00e7\u00e3o provoca. \u201cSe for uma crian\u00e7a, pode sofrer de dores, sangramentos, infe\u00e7\u00f5es. Mas a maioria das pacientes que aparece s\u00e3o mulheres adultas, que sofrem toda a amplitude das consequ\u00eancias. Podem ter grandes dificuldades em urinar, em libertar o sangue menstrual, em ter rela\u00e7\u00f5es sexuais. Muitas dessas mulheres carregam tamb\u00e9m graves problemas psicol\u00f3gicos. Uma em cada seis sofre de stress p\u00f3s-traum\u00e1tico ou de sintomas associados\u201d, explica-nos Kelly. A pr\u00e1tica \u00e9 proibida no Reino Unido, mas alguns ativistas denunciam a vinda de mulheres das comunidades em quest\u00e3o, mais velhas, respons\u00e1veis por efetuar as abla\u00e7\u00f5es. Por outro lado, as autoridades suspeitam que as fam\u00edlias aproveitam tamb\u00e9m as f\u00e9rias escolares para o fazer no pa\u00eds natal. \u201cAchava que ia acabar como escrava de um homem qualquer\u201d \u201cZara\u201d, nome fict\u00edcio, conta-nos a sua hist\u00f3ria: \u201cA ideia do meu pai era casar-me atrav\u00e9s do Skype e excisar-me antes ou logo a seguir ao casamento, antes de qualquer o sexual com o meu marido. Disseram-me que tinha de o fazer porque sen\u00e3o n\u00e3o era boa mu\u00e7ulmana, n\u00e3o obedecia aos preceitos do Isl\u00e3o e que podia cheirar a urina\u201d. Zara \u00e9 de origem asi\u00e1tica e cresceu em Inglaterra. Revela-nos que houve dias em que pensou \u201cacabar com tudo\u2026\u201d. Muitas mulheres e raparigas, como ela, sofrem em sil\u00eancio. Vivem aterrorizadas com a ideia de ter de confrontar a fam\u00edlia e a comunidade. O caso de Zara foi diferente. Ela acabou por revelar as inten\u00e7\u00f5es do pr\u00f3prio pai \u00e0s autoridades. A pol\u00edcia interveio. Foi emitido um mandado de prote\u00e7\u00e3o para impedir a mutila\u00e7\u00e3o e o casamento for\u00e7ado: aqueles que infringirem esta ordem ser\u00e3o levados perante a Justi\u00e7a. O pai de Zara foi alvo de acusa\u00e7\u00f5es formais, mas ela disse-nos que optou por n\u00e3o avan\u00e7ar com o processo. \u201cEu quero fazer ar uma mensagem. Mas tamb\u00e9m quero ter a minha pr\u00f3pria vida. N\u00e3o quero perder o meu pai. Ele esteve sempre ao meu lado, era o meu melhor amigo, ouvia-me sempre que eu precisava de falar. Perdi o o com a minha m\u00e3e quando era pequena, ela tinha problemas mentais muito s\u00e9rios. Ou seja, o meu pai tornou-se na \u00fanica pessoa com quem eu podia falar. E n\u00e3o queria perder isso\u201d, diz-nos. No entanto, sublinha que antes se sentia \u201ccompletamente de m\u00e3os atadas. Achava que nunca ia conseguir ter a minha pr\u00f3pria vida, que ia acabar como escrava de um homem qualquer. Mas aprendi a ter consci\u00eancia do que pode ser feito e do que n\u00e3o pode ser feito. Sinto que tenho mais poder\u201d. Prevenir atrav\u00e9s das m\u00e3es Karyne Tazi faz parte de um movimento ativista em Wolverhampton que luta pela erradica\u00e7\u00e3o da mutila\u00e7\u00e3o genital feminina. Considera que grande parte da preven\u00e7\u00e3o se centra na educa\u00e7\u00e3o das m\u00e3es j\u00e1 submetidas ao ritual. \u201cMuitas das vezes, \u00e9 uma quest\u00e3o de conseguir mudar a mentalidade destas mulheres, de desafi\u00e1-las a refletir e garantir que a gera\u00e7\u00e3o seguinte n\u00e3o vai sofrer o mesmo. Porque, ao fim e ao cabo, s\u00e3o provavelmente essas mulheres que o ter\u00e3o de fazer \u00e0s pr\u00f3prias filhas. Temos de mostrar-lhes que \u00e9 uma forma de abuso e que \u00e9 ilegal\u201d, afirma. Em Portugal, por exemplo, um estudo recente indica que mais de seis mil mulheres foram v\u00edtimas desta pr\u00e1tica, sobretudo entre a comunidade imigrante da Guin\u00e9-Bissau.", "dateCreated": "2016-10-13T19:32:22+02:00", "dateModified": "2016-10-13T19:32:22+02:00", "datePublished": "2016-10-13T19:32:22+02:00", "image": { "@type": "ImageObject", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Farticles%2F346237%2F1440x810_346237.jpg", "width": 1440, "height": 810, "caption": "Cerca de 200 milh\u00f5es de mulheres j\u00e1 foram v\u00edtimas de mutila\u00e7\u00e3o genital. O Insiders apresenta relatos in\u00e9ditos de quem decidiu travar a vontade da fam\u00edlia.", "thumbnail": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Farticles%2F346237%2F432x243_346237.jpg", "publisher": { "@type": "Organization", "name": "euronews", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Fwebsite%2Fimages%2Feuronews-logo-main-blue-403x60.png" } }, "author": { "@type": "Organization", "name": "Euronews", "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ], "url": "/" }, "publisher": { "@type": "Organization", "name": "Euronews", "legalName": "Euronews", "url": "/", "logo": { "@type": "ImageObject", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Fwebsite%2Fimages%2Feuronews-logo-main-blue-403x60.png", "width": 403, "height": 60 }, "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ] }, "articleSection": [ "S\u00e9rie: a minha Europa" ], "isAccessibleForFree": "False", "hasPart": { "@type": "WebPageElement", "isAccessibleForFree": "False", "cssSelector": ".poool-content" } }, { "@type": "WebSite", "name": "Euronews.com", "url": "/", "potentialAction": { "@type": "SearchAction", "target": "/search?query={search_term_string}", "query-input": "required name=search_term_string" }, "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ] } ] }

Mutilação genital feminina: O crime do qual muito poucos falam

Mutilação genital feminina: O crime do qual muito poucos falam
Direitos de autor 
De Euronews
Publicado a
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
Copiar/colar o link embed do vídeo:Copy to clipboardCopied

Cerca de 200 milhões de mulheres já foram vítimas de mutilação genital. O Insiders apresenta relatos inéditos de quem decidiu travar a vontade da família.

O seguinte dado não deixa de parecer inconcebível nos dias que correm: segundo um relatório da Unicef,cerca de 200 milhões de mulheresno mundo inteiro foram vítimas de mutilação genital. O Insiders apresenta relatos inéditos de quem decidiu travar a vontade da família e terminar abruptamente a adolescência contra tudo e todos à sua volta. Uma reportagem da autoria de Damon Embling.

“Fui amarrada, afastaram-me as pernas e senti que havia um objeto afiado. Na altura, nem sequer entendi o que estavam a fazer, senti apenas que estavam a tentar cortar algo das minhas partes íntimas. Foi um choque quando percebi. Nunca me ou pela cabeça que a minha própria família pudesse organizar uma tamanha violência contra mim.”

O relato é de Sarian Karim Kamare, de 39 anos. Vive em Londres, onde tem um supermercado. Com apenas 11 anos, os seus órgãos genitais externos foram removidos com uma faca, sem qualquer anestesia. Tudo aconteceu na Serra Leoa, o seu país natal.

Captured and cut: #FGM returns to Sierra Leone despite ban, highlighting the challenges facing anti-FGM campaigners https://t.co/p0wMEt0ppw

— Sarah Hyde (@SazBN1) 30 septembre 2016

“Eles fazem-nos isso como forma de nos integrar na comunidade e porque faz parte da cultura. Mas não está escrito em nenhum dos livros sagrados. Eles adotaram uma prática cultural que está errada. Submetem as mulheres a uma dor devastadora para as controlar, sobretudo as suas pulsões sexuais. E funciona. Destrói completamente o nosso apetite sexual”, conta-nos.

Para além das consequências físicas, o stress pós-traumático

É difícil apurar a verdadeira dimensão do fenómeno da mutilação genital feminina. A vergonha e o medo impedem que muitas das histórias venham a público. No Reino Unido, as estimativas rondam as 170 mil mulheres e raparigas já sujeitas a esta prática. A maior parte terá sido submetida à excisão nos países de origem. A Somália, a Gâmbia e o Sudão estão no topo da lista.

Oficialmente, os serviços de saúde britânicos detetam uma média de 100 casos por semana. A médica Brenda Kelly dirige a Rose Clinic em Oxford, especializada nos diversos problemas de saúde que este tipo de mutilação provoca. “Se for uma criança, pode sofrer de dores, sangramentos, infeções. Mas a maioria das pacientes que aparece são mulheres adultas, que sofrem toda a amplitude das consequências. Podem ter grandes dificuldades em urinar, em libertar o sangue menstrual, em ter relações sexuais. Muitas dessas mulheres carregam também graves problemas psicológicos. Uma em cada seis sofre de stress pós-traumático ou de sintomas associados”, explica-nos Kelly.

A prática é proibida no Reino Unido, mas alguns ativistas denunciam a vinda de mulheres das comunidades em questão, mais velhas, responsáveis por efetuar as ablações. Por outro lado, as autoridades suspeitam que as famílias aproveitam também as férias escolares para o fazer no país natal.

“Achava que ia acabar como escrava de um homem qualquer”

“Zara”, nome fictício, conta-nos a sua história: “A ideia do meu pai era casar-me através do Skype e excisar-me antes ou logo a seguir ao casamento, antes de qualquer o sexual com o meu marido. Disseram-me que tinha de o fazer porque senão não era boa muçulmana, não obedecia aos preceitos do Islão e que podia cheirar a urina”.

Zara é de origem asiática e cresceu em Inglaterra. Revela-nos que houve dias em que pensou “acabar com tudo…”. Muitas mulheres e raparigas, como ela, sofrem em silêncio. Vivem aterrorizadas com a ideia de ter de confrontar a família e a comunidade. O caso de Zara foi diferente. Ela acabou por revelar as intenções do próprio pai às autoridades. A polícia interveio. Foi emitido um mandado de proteção para impedir a mutilação e o casamento forçado: aqueles que infringirem esta ordem serão levados perante a Justiça. O pai de Zara foi alvo de acusações formais, mas ela disse-nos que optou por não avançar com o processo.

“Eu quero fazer ar uma mensagem. Mas também quero ter a minha própria vida. Não quero perder o meu pai. Ele esteve sempre ao meu lado, era o meu melhor amigo, ouvia-me sempre que eu precisava de falar. Perdi o o com a minha mãe quando era pequena, ela tinha problemas mentais muito sérios. Ou seja, o meu pai tornou-se na única pessoa com quem eu podia falar. E não queria perder isso”, diz-nos.

No entanto, sublinha que antes se sentia “completamente de mãos atadas. Achava que nunca ia conseguir ter a minha própria vida, que ia acabar como escrava de um homem qualquer. Mas aprendi a ter consciência do que pode ser feito e do que não pode ser feito. Sinto que tenho mais poder”.

Prevenir através das mães

Karyne Tazi faz parte de um movimento ativista em Wolverhampton que luta pela erradicação da mutilação genital feminina. Considera que grande parte da prevenção se centra na educação das mães já submetidas ao ritual.

“Muitas das vezes, é uma questão de conseguir mudar a mentalidade destas mulheres, de desafiá-las a refletir e garantir que a geração seguinte não vai sofrer o mesmo. Porque, ao fim e ao cabo, são provavelmente essas mulheres que o terão de fazer às próprias filhas. Temos de mostrar-lhes que é uma forma de abuso e que é ilegal”, afirma.

Em Portugal, por exemplo, um estudo recente indica que mais de seis mil mulheres foram vítimas desta prática, sobretudo entre a comunidade imigrante da Guiné-Bissau.

Ir para os atalhos de ibilidade
Partilhe esta notíciaComentários

Notícias relacionadas

Mutilação Genital Feminina: Há 200 milhões de vítimas em todo o mundo

"Cada vaga migratória obriga a uma reflexão sobre os direitos das mulheres"

França depois dos atentados de 2015