O relatório anual "Unidos na Ciência" subinha o papel da inteligência artificial na previsão metereológica.
De acordo com um novo relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM), é mais do que provável que o mundo venha a registar uma subida de 3°C em relação aos níveis pré-industriais durante este século.
Divulgado na terça-feira, o relatório anual "Unidos na Ciência" reúne os dados científicos mais recentes sobre o clima, na esperança de orientar a população para um futuro mais seguro.
O relatório surge num altura em que países da Europa Central enfrentam inundações mortais, na sequência da tempestade Boris. Itália encontra-se em alerta máximo, após evacuações em massa na Polónia, Chéquia, Roménia e Áustria.
"Precisamos, agora, de uma ação urgente e ambiciosa para apoiar o desenvolvimento sustentável, a ação climática e a redução do risco de catástrofes", afirmou a secretária-geral da OMM, Celeste Saulo.
Apesar da clareza preocupante da ciência, o relatório - compilado por um consórcio de agências das Nações Unidas, organizações meteorológicas e organismos de investigação - oferece motivos de esperança. Abaixo seguem algumas das soluções que o relatório destaca.
5. A inteligência artificial pode "revolucionar" a previsão meteorológica
Numa altura em que o mundo se debate com o potencial ambiental e as armadilhas da inteligência artificial (IA), a OMM destaca um domínio em que esta se torna indispensável: a previsão meteorológica.
Graças aos rápidos progressos registados, a IA e a aprendizagem automática (ML) podem tornar a modelação meteorológica mais rápida, mais barata e mais ível aos países com rendimentos mais baixos, segundo o relatório.
Treinados com base em conjuntos de dados de reanálise e de observação, os modelos de IA/ML podem prever eventos perigosos, como ciclones tropicais, ou fazer previsões a longo prazo sobre os fenómenos El Niño e La Niña.
Apesar das "enormes oportunidades" para proteger as pessoas, os modelos estão limitados pela qualidade e disponibilidade dos dados, e os modelos atuais não incluem variáveis mais difíceis de prever relacionadas com o oceano, a terra, a criosfera [partes congeladas do planeta] e o ciclo do carbono.
É necessária uma governação global forte para garantir que a IA e o ML sirvam o bem global, acrescenta a OMM.
4. Uma imagem mais clara a partir do espaço
De acordo com o relatório da OMM, os grandes progressos registados nas observações da Terra baseadas no espaço oferecem "vastas oportunidades" para o futuro.
Segundo o relatório, as observações de alta resolução e de alta frequência são cruciais para uma previsão meteorológica eficaz, para a previsão do clima e para a monitorização ambiental.
A colaboração é fundamental neste domínio para que as parcerias público-privadas sirvam objetivos globais e preencham as lacunas de dados relativos ao oceano, ao clima, ao aerossol, às variáveis hidrológicas e à criosfera.
3. Os gémeos digitais, a RV e o metaverso também têm um papel a desempenhar
O relatório destaca outra parte promissora do nosso mundo digital: as tecnologias imersivas, como os gémeos digitais, a realidade virtual e o metaverso.
Os gémeos digitais são uma representação virtual de um sistema do mundo real, com todos os pontos de dados precisos para testar a forma como a realidade responderia numa determinada situação. O metaverso junta mundos virtuais num "sistema integrador" que proporciona experiências imersivas.
Pode ser difícil de compreender, mas as aplicações são de grande alcance: desde a simulação de inundações e secas até à previsão do fluxo de água e da degradação dos solos. Estas tecnologias podem ajudar os especialistas a tomar decisões mais informadas.
2. As abordagens transdisciplinares conduzem a melhores soluções para o clima
Apesar destas oportunidades empolgantes para a tecnologia abordar as alterações climáticas, a redução do risco de catástrofes e o desenvolvimento sustentável, o relatório salienta que estes desafios globais não podem ser resolvidos apenas com um tipo de conhecimento.
Em vez disso, salienta a necessidade de uma "abordagem transdisciplinar", através da qual diversos atores, incluindo cientistas, decisores políticos, comunidades indígenas e grupos da sociedade civil, co-criam soluções em conjunto.
O envolvimento destas partes interessadas desde o início e a adaptação das soluções aos contextos locais são a chave do sucesso.
1. Sistemas de alerta precoce para todos
Tal como o secretário-geral da ONU, António Guterres, tem repetidamente insistido, os sistemas de alerta precoce para riscos múltiplos (MHEWS) são fundamentais para salvar vidas.
As provas mostram que a mortalidade relacionada com catástrofes em países com uma cobertura limitada a moderada de MHEWS é quase seis vezes superior à dos países com uma cobertura substancial a abrangente, afirma a OMM.
Mais de metade dos países do mundo estão atualmente protegidos por esses sistemas, mas subsistem lacunas significativas. Com a iniciativa Avisos Rápidos para Todos (EW4ALL), a OMM pretende que todos estejam cobertos até ao final de 2027. A IA também tem um papel a desempenhar neste domínio, diz o relatório.
Porque é que a ação climática é tão vital?
Fazer um balanço da crise climática deveria ser um estímulo suficiente para a ação, sugere o relatório.
Os impactos das alterações climáticas e das condições meteorológicas extremas estão a inverter os ganhos de desenvolvimento e a ameaçar o bem-estar das pessoas e do planeta.
De acordo com as políticas atuais, o relatório da United in Science aponta para uma probabilidade de dois terços de o aquecimento global atingir 3°C acima da era pré-industrial até 2100.
É necessária uma ação urgente para evitar os cenários mais desastrosos. Para limitar o aquecimento global a menos de 2°C ou 1,5°C, as emissões globais de gases com efeito de estufa (GEE) em 2030 devem ser reduzidas em 28% ou 42%, respetivamente, em relação aos níveis previstos pelas políticas atuais.
Trata-se de um pedido muito ambicioso, mas existem precedentes para reduzir as trajectórias das emissões para uma direção mais segura. Quando o Acordo de Paris foi adotado, as emissões de gases com efeito de estufa deveriam aumentar 16% até 2030 em relação a 2015. Atualmente, esse aumento previsto é de três por cento.