A vitória na primeira volta do ultranacionalista pró-Moscovo Cǎlin Georgescu chocou a sociedade romena e levantou suspeitas da existência de ingerência russa nas eleições.
O Tribunal Constitucional da Roménia certificou a vitória surpreendente de um populista de extrema-direita pouco conhecido na primeira volta das eleições presidenciais, um resultado que mergulhou o país numa crise política devido a alegações de violações eleitorais e interferência russa.
A decisão do tribunal romeno abre caminho a uma segunda volta, a 8 de dezembro, entre Cǎlin Georgescu, um ultranacionalista pró-Moscovo que concorre como independente, e a candidata de centro-direita Elena Lasconi, da União Salvar a Roménia (USR).
A Roménia tem estado em ambiente de agitação desde a vitória de Georgescu em 24 de novembro, o que levantou preocupações sobre uma possível intromissão estrangeira nas eleições de um Estado-membro da UE e da NATO - um Estado que é fidedignamente pró-ocidental e um firme apoiante da Ucrânia.
Georgescu, que antes da votação conquistava apenas um dígito nas sondagens, venceu com 22,9%, contra 19,2% de Lasconi.
A recontagem dos votos foi efetuada na sequência de uma queixa apresentada por Cristian Terhes, um candidato presidencial que obteve 1% dos votos na primeira volta. Terhes disse que o tribunal ordenou a recontagem na quinta-feira "devido a indícios de fraude", alegando que os votos válidos de Ludovic Orban, um antigo primeiro-ministro que tinha desistido da corrida mas que permaneceu no boletim de voto, foram reatribuídos a Lasconi.
"Os juízes decidiram por unanimidade (...) confirmar e validar o resultado da primeira volta presidencial de 24 de novembro e realizar a segunda volta a 8 de dezembro", declarou o juiz principal Marian Enache, na segunda-feira.
A decisão foi tomada um dia depois de uma eleição parlamentar em que o Partido Social-Democrata (PSD), de esquerda, parecia estar no bom caminho para ganhar a maioria dos votos, enquanto a extrema-direita obteve ganhos significativos.
Com 99,98% dos votos contados, o PSD obteve 22,3%, à frente da Aliança para a União dos Romenos (AUR), de extrema-direita, com 18,3%. A oposição centrista de Lasconi, USR, obteve 12,3%, enquanto o Partido Nacional Liberal (PNL), aliado júnior da coligação governamental, obteve 14,3%.
Os grupos de extrema-direita SOS e Partido dos Jovens (POT) obtiveram 7,8% e 6,4%, respetivamente, e o partido étnico húngaro UDMR obteve 6,4%.
Embora já estejam a decorrer negociações para formar uma coligação governamental, o vencedor da corrida presidencial terá a última palavra, uma vez que é o presidente que nomeia o primeiro-ministro.
A influência do TikTok
Embora os resultados das eleições parlamentares pareçam reafirmar a posição pró-UE e pró-NATO da Roménia - cerca de 70% dos votos foram para os partidos tradicionais - os ganhos da extrema-direita e a vitória de Georgescu a 24 de novembro refletem uma polarização crescente.
As narrativas anti-UE e anti-NATO têm sido predominantes no país, especialmente nas redes sociais, desde a pandemia de Covid-19 e a invasão total da Ucrânia pela Rússia em 2022.
O surpreendente sucesso de Georgescu suscitou uma série de protestos por parte de cidadãos que afirmam que o candidato é uma ameaça à democracia e que estão preocupados com comentários anteriores que fez elogiando os líderes fascistas e nacionalistas romenos, bem como o presidente russo Vladimir Putin.
Muitos analistas políticos atribuíram o rápido crescimento da popularidade de Georgescu à sua presença na rede social TikTok.
Sem citar o nome de Georgescu, o gabinete do presidente romeno, Klaus Iohannis, afirmou na quinta-feira, após uma reunião do Conselho Superior de Defesa Nacional, que uma análise de documentos revelou que "um candidato presidencial beneficiou de uma enorme exposição devido ao tratamento preferencial concedido pela plataforma TikTok".
O Conselho Nacional do Audiovisual da Roménia pediu à Comissão Europeia que investigasse o papel do TikTok na votação da primeira volta.
Pavel Popescu, vice-presidente do órgão regulador dos meios de comunicação social da Roménia, a Ancom, disse que iria pedir a suspensão do TikTok no país se as investigações encontrassem provas de "manipulação do processo eleitoral".
O TikTok disse na segunda-feira que era "impreciso e enganador" atribuir a atividade da campanha de Georgescu apenas à aplicação, tendo observado que o candidato também usou outras redes sociais.
Na semana ada, o Conselho Superior de Defesa Nacional também afirmou ter provas de ciberataques com o objetivo de influenciar as eleições no país. Elabora que a Roménia terá sido alvo de "ações hostis de atores estatais e não estatais, especialmente da Federação Russa".
Moscovo negou, na sexta-feira, ter participado em qualquer ação desse tipo.
"Não temos o hábito de interferir nas eleições de outros países, em particular na Roménia, nem tencionamos fazê-lo agora", afirmou o porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov.