Zelenskyy esclareceu que a Ucrânia não está a procurar obter armas nucleares, mas sublinhou a necessidade de aderir à NATO para garantir a segurança face à agressão russa.
Para além da adesão à NATO, a única opção para a Ucrânia seriam as armas nucleares, disse Volodymyr Zelenskyy ao Conselho Europeu, no início desta semana, quando se discutia o que é necessário fazer para proteger o país da Europa de Leste que ainda se defende da invasão de Moscovo.
"Quem é que desistiu das armas nucleares? Todos? ... Ucrânia. Quem está a lutar hoje? A Ucrânia", disse Zelenskyy.
Como se pode imaginar, a declaração teve um impacto balístico.
Mais tarde nesse dia, numa reunião com o chefe máximo da NATO, Mark Rutte, Zelenskyy teve de explicar que a Ucrânia nunca discutiu a possibilidade de produzir armas nucleares ou de construir uma bomba nuclear.
"Não estamos a construir armas nucleares. O que eu quis dizer é que, atualmente, não existe nenhuma garantia de segurança mais forte para nós do que a adesão à NATO", esclareceu.
O Ministério dos Negócios Estrangeiros ucraniano emitiu mesmo uma declaração afirmando que Kiev não planeia desenvolver armas de destruição maciça e que continua empenhada na não proliferação nuclear.
"A Ucrânia está convencida de que o TNP (Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares) continua a ser a pedra angular da arquitetura de segurança internacional global", afirma a declaração do ministério.
"Apesar da agressão russa em curso, a Ucrânia continua a cumprir as disposições do TNP e continua a ser um participante responsável no regime internacional de não proliferação nuclear".
Zelenskyy teve então de explicar que estava a ilustrar o quão terrível era a situação de Kiev, referindo-se ao Memorando de Budapeste de 1994, que previa que a Ucrânia desistisse do seu arsenal nuclear em troca de garantias de segurança das principais potências nucleares, incluindo o Reino Unido, os EUA e a Rússia.
Do ponto de vista atual, a entrega das armas nucleares foi um erro e não a disso mesmo.
"Quais destas grandes potências nucleares sofreram? Todas? Não. (Apenas) a Ucrânia", disse Zelenskyy na reunião do Conselho da UE em Bruxelas, na quinta-feira.
Apesar das garantias de respeito e proteção da integridade territorial da Ucrânia, Moscovo violou a soberania ucraniana duas vezes na última década, "deixando a Ucrânia sem outra alternativa que não seja a adesão à NATO para garantir a sua segurança".
O que é o Memorando de Budapeste e o que fez pela Ucrânia?
Em dezembro de 1994, os dirigentes dos Estados Unidos, do Reino Unido e da Rússia reuniram-se em Budapeste para prometer garantias de segurança à Ucrânia no âmbito da sua adesão ao Tratado de Não Proliferação de Armas Nucleares (TNP) como Estado sem armas nucleares.
A Ucrânia concordou em abdicar do seu arsenal nuclear - o terceiro maior do mundo - que herdou da União Soviética e, além disso, em transferir todas as cerca de 1900 ogivas nucleares para a Rússia para serem desmanteladas.
Vinte anos depois, em 2014, a Rússia invadiu pela primeira vez a Ucrânia, anexou ilegalmente a Crimeia e ocupou vastos territórios no leste do país.
Desde o colapso da União Soviética, a Rússia tem continuado a desenvolver e a modernizar o seu arsenal nuclear. Em setembro, Moscovo tentou testar o seu mais recente míssil balístico intercontinental, o RS-28 Sarmat, também conhecido como Satan II, e proclamado pelas autoridades russas como a arma nuclear "mais mortífera do mundo".
Matt Korda, investigador sénior associado do Instituto Internacional de Investigação para a Paz de Estocolmo (SIPRI), disse à Euronews Next que o RS-28 se destina a substituir funcionalmente o RS-20V Voevoda, um míssil criado há mais de 30 anos.
Tal como muitos outros mísseis da família dos mísseis balísticos intercontinentais soviéticos, foi originalmente desenvolvido pela Pivdenmash, uma empresa aeroespacial estatal ucraniana na cidade ucraniana de Dnipro.
Em muitos casos, os sistemas de controlo destes mísseis foram concebidos pela Khartron, antiga Electropribor, um gabinete de engenharia de conceção em Kharkiv. Desde o início da invasão em grande escala em 2022, a Rússia tem atacado regularmente Dnipro e Kharkiv com os seus mísseis.
Comentando a declaração de Zelenskyy, o Presidente russo, Vladimir Putin, afirmou na sexta-feira que Moscovo não permitirá que a Ucrânia obtenha armas nucleares e que qualquer movimento da Ucrânia nesse sentido não pode ser ocultado e provocará uma resposta russa adequada.
"A Rússia não permitirá que isso aconteça, aconteça o que acontecer", disse Putin aos jornalistas.
'Não nos tornámos animais'
O chefe do Gabinete do Presidente da Ucrânia, Andrii Yermak, disse na sexta-feira que foi a própria Ucrânia que decidiu livrar-se das armas nucleares em 1994 e insistiu que a declaração de Zelenskyy foi mal interpretada.
Yermak disse que o que a Ucrânia quer são garantias de segurança e não armas nucleares.
"Queremos receber aquilo a que temos direito", afirmou, referindo-se ao memorando de Budapeste.
O Presidente do Conselho Europeu sublinhou que o resultado do memorando foi injusto para a Ucrânia, mas garantiu que Kiev não irá retribuir da mesma forma injusta.
"Todos nós, na Ucrânia, estamos a viver esta guerra terrível, muitos de nós perdemos os nossos familiares, os nossos amigos, mas a diferença é que não nos tornámos animais. Esta é a diferença entre nós e a Rússia".