Os católicos na Amazónia dizem que a presença do novo Papa na COP30 no Brasil, no final deste ano, é necessária.
O bispo sentou-se calmamente perto da primeira fila, de mãos-postas, a ouvir os líderes indígenas e os trabalhadores da igreja falarem sobre as ameaças às florestas do norte do Peru, uma parte da floresta amazónica. Estávamos em 2016, um ano depois da Laudato Si, a encíclica do Papa Francisco sobre o ambiente.
Quando foi chamado a falar, o bispo não pregou, apesar de estar na sua cidade de Chiclayo como anfitrião de um encontro regional. Em vez disso, refletiu sobre o que tinha visto.
“É uma encíclica muito importante”, referiu. “Também representa algo de novo em termos desta expressão explícita da preocupação da Igreja por toda a criação.”
Esse bispo, Robert Prevost, é atualmente o Papa Leão XIV.
“Ele foi sempre muito acolhedor, muito próximo das pessoas”, recordou Laura Vargas, secretária do Conselho Inter-religioso do Peru, que ajudou a organizar o evento, numa entrevista telefónica à Associated Press.
“Não teve qualquer problema em dizer que sim quando lhe propusemos - estava genuinamente interessado no trabalho pastoral social.”
Desde então, Prevost aprofundou os seus laços com redes ambientais inter-religiosas como a Interfaith Rainforest Initiative e organizações indígenas como a AIDESEP, que colocam os direitos e a proteção das florestas no centro das preocupações da Igreja.
Estas credenciais trouxeram esperança aos clérigos e fiéis da região amazónica, uma vasta área com 48 milhões de habitantes e 6,7 milhões de quilómetros quadrados na América do Sul. Prevost, nascido em Chicago, que ou cerca de duas décadas no interior do Peru, é visto como um pontífice que protege a região e luta contra as alterações climáticas.
Papa Leão XIV tem experiência prática na Amazónia
Muitos católicos disseram acreditar que a experiência de Prevost como bispo de Chiclayo, uma cidade de 630 mil habitantes no norte do Peru e não muito longe da Amazónia, foi uma das principais razões que o levaram a ser escolhido.
Afirmaram também que a experiência prática do Sumo Pontífice numa área empobrecida, longe das grandes cidades, poderia ser-lhe útil para lidar com a Amazónia e enfrentar os seus desafios.
A Amazónia é um regulador fundamental do clima, uma vez que as suas densas florestas absorvem o dióxido de carbono, um gás com efeito de estufa que, quando libertado na atmosfera, aquece o planeta. No entanto, muitas partes da Amazónia estão ameaçadas por um vasto leque de atividades ilegais: agricultores que abatem árvores para criar vacas, exploradores de minérios que dragam rios e destroem os ecossistemas locais e usurpadores de terras que se apoderam de territórios.
Os incêndios florestais e as secas, agravados pelas alterações climáticas, também atingiram duramente as comunidades amazónicas nos últimos anos.
Prevost está bem familiarizado com estas questões, tendo presidido à Comissão Pontifícia para a América Latina, o que o ajudou a estabelecer laços com colegas dos nove países cruzados pela Amazónia. Muitos deles estão entre os 105 bispos de uma organização que ele apoia abertamente, a Rede Eclesial Pan-Amazónica, uma rede da Igreja Católica centrada na região amazónica.
"Falei com ele várias vezes sobre a Amazónia e o ambiente. Ele não precisa de ser convencido acerca da sua importância", disse o cardeal Pedro Barreto, o presidente da rede, que conhece Prevost desde que ele se tornou bispo de Chiclayo, em 2015.
O frade brasileiro Paulo Xavier concorda.
“Leão XIV seguirá Francisco; estamos a avançar na proteção do meio ambiente”, disse Xavier. “O Espírito Santo agiu em nosso favor.”
Xavier está baseado em Manaus, uma cidade de dois milhões de habitantes na Amazónia, que recebeu o seu primeiro cardeal nomeado por Francisco em 2022: o agora arcebispo Leonardo Steiner, de 74 anos, um entusiasta da Laudato Si.
Steiner, Xavier e a arquidiocese de Manaus têm investido para levar a encíclica às mãos dos habitantes locais, mesmo quando isso significa saltar em pequenas canoas motorizadas pelas águas castanhas do rio Negro para chegar a aldeias isoladas, em viagens que podem durar dias num barco.
Será o Papa Leão XIV um Papa de ação?
Em novembro de 2024, o Vatican News noticiou que Prevost apelou a mais ações para combater as alterações climáticas e proteger o ambiente durante um seminário em Roma. Citou os esforços que o Vaticano tem feito, como a instalação de painéis solares e veículos elétricos.
Na plataforma X, Prevost voltou a publicar mensagens sobre a proteção do ambiente. Uma mensagem que publicou a 1 de abril de 2017 expressava preocupação com as emissões de dióxido de carbono, um gás que aquece o planeta, durante o primeiro mandato do presidente Donald Trump.
Laura Vicuña, uma mulher indígena do povo Cariri e vice-presidente da Conferência Eclesial da Região Amazónica, afirmou, numa carta publicada nas redes sociais, que espera que o Papa seja um aliado na luta contra as alterações climáticas. A conferência foi criada por Francisco em 2020 para promover o debate entre clérigos e leigos.
“Da nossa querida Amazónia, pedimos-lhe que seja nosso aliado na defesa do que é mais sagrado para nós: a vida, a terra e os direitos”, escreveu Vicuña.
Os povos indígenas, como os Cariri de Vicuña, são frequentemente considerados como os principais protetores da Amazónia, mas há vários anos que são expulsos das suas terras por criminosos, pela desflorestação e pela fome, como se viu nas terras Yanomami no Norte do Brasil, em 2023.
O espanhol Luis Ventura, secretário-executivo do Conselho Indigenista Missionário do Brasil, disse que reza para que o novo Papa mantenha os olhos na Amazónia, com especial atenção para as comunidades indígenas. Fundado em 1972, o conselho teve raras ocasiões de se encontrar com pontífices até a ascensão de Francisco em 2013. Os seus membros esperam que Leão XIV não mude isso.
"Leão XIV terá um grande impacto na Amazónia", considerou Ventura. "Durante a sua vida esteve sempre com as pessoas do Peru, e isso permite-nos pensar que a Igreja estará profundamente envolvida no território."
"Precisamos dele na COP"
Francisco mostrou grande interesse pela Amazónia durante o seu pontificado. Quatro anos depois da Laudato Si, organizou o Sínodo para a Amazónia, que procurou “novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.
Rose Bertoldo, uma das secretárias da arquidiocese de Manaus, disse estar esperançosa quanto ao futuro da região sob o comando de Leão XIV, prevendo que ele irá seguir as pisadas de Francisco. Acrescentou que o novo pontífice terá a oportunidade de visitar o Brasil, a nação com mais católicos no mundo, durante a cimeira climática da ONU deste ano, conhecida como COP30, na cidade amazónica de Belém, em novembro.
"Sabemos que as urgências e os desafios na Amazónia serão maiores devido ao contexto político global de divisão. Precisamos dele na COP", mencionou Bertoldo.
O padre irlandês Peter Hughes, que ou a maior parte da sua vida no Peru, conheceu Prevost pouco depois de ter chegado ao país andino em 1985. Tornaram-se rapidamente amigos e viam-se quando o bispo de Chiclayo estava na capital, Lima.
“Naquela altura, [Prevost] estava preocupado com o extrativismo na Amazónia e com o efeito que tinha nos pobres”, recordou Hughes, referindo-se ao novo Sumo Pontífice. “Agora que o mundo é muito mais complexo, a urgência é evidente.”