{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/2022/10/13/a-justica-internacional-nao-e-uma-construcao-teorica-karim-khan" }, "headline": "\u201cA justi\u00e7a internacional n\u00e3o \u00e9 uma constru\u00e7\u00e3o te\u00f3rica\u201d \u2013 Karim Khan", "description": "\u201cEstamos num momento muito cr\u00edtico. Quando falamos sobre armas nucleares t\u00e1ticas, n\u00e3o \u00e9 apenas uma zona de penumbra [Twilight Zone], \u00e9 a v\u00e9spera de um pesadelo. Precisamos de levar o assunto muito a s\u00e9rio. Acho que a lei tem um papel a desempenhar. Isto n\u00e3o \u00e9 um filme de Hollywood.\u201d", "articleBody": "Estamos perante mais uma escalada violenta da guerra na Ucr\u00e2nia, incluindo ataques contra alvos civis. Existem fortes apelos \u00e0 justi\u00e7a internacional, tanto para os crimes de guerra cometidos em territ\u00f3rio ucraniano como para a dissuas\u00e3o. O procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia, Karim Khan , \u00e9 o nosso convidado desta edi\u00e7\u00e3o do Global Conversation. Shona Murray, euronews : \u00c0 luz dos acontecimentos dos \u00faltimos dias, do que vimos em Bucha, da decis\u00e3o da Comiss\u00e3o das Na\u00e7\u00f5es Unidas para os Direitos Humanos de investigar 30 cidades, onde encontraram provas de execu\u00e7\u00f5es e de viola\u00e7\u00e3o, mesmo de crian\u00e7as de quatro anos e de adultos nos seus oitenta, qual \u00e9 o papel do TPI no julgamento destes crimes graves? Karim Khan : O papel do procedimento penal \u00e9 garantir que haja responsabiliza\u00e7\u00e3o, que n\u00e3o haja ref\u00fagio para a impunidade, que n\u00e3o exista uma cren\u00e7a crescente de que tudo pode acontecer, que os actos criminosos tenham consequ\u00eancias. Isso exige que estejamos presentes. 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Para os ucranianos que est\u00e3o agora espalhados pela Europa, que est\u00e3o fora das suas casas, que est\u00e3o separados dos seus entes queridos. Para aqueles, como membros da minha equipa que est\u00e3o em Kiev, que est\u00e3o abrigados no subsolo e se perguntam quando ser\u00e3o atingidos pelo pr\u00f3ximo m\u00edssil. Estes civis merecem toda a prote\u00e7\u00e3o. SM : Nesse caso, qual \u00e9 o processo se houver evid\u00eancia de viola\u00e7\u00e3o da Conven\u00e7\u00e3o de Genebra por indiv\u00edduos espec\u00edficos? Existe um procedimento para que essas pessoas possam ser presas em territ\u00f3rio russo ou em territ\u00f3rio ucraniano? Karim Khan : N\u00e3o vou entrar em nenhum cen\u00e1rio espec\u00edfico mas certamente \u00e9 bem conhecido - e vimos isso na ex-Jugosl\u00e1via, em Ruanda, no Tribunal Penal Internacional - que se eu determinar ap\u00f3s investiga\u00e7\u00f5es que h\u00e1 motivos para acreditar que um indiv\u00edduo cometeu crimes, posso requerer um mandado. Os ju\u00edzes determinar\u00e3o se esses motivos s\u00e3o ou n\u00e3o suficientes, e depois segue-se uma fase de avalia\u00e7\u00e3o das possibilidades de op\u00e7\u00e3o de captura. Ou ent\u00e3o as pessoas entregam-se voluntariamente. Tivemos chefes de estado que se renderam voluntariamente perante este tribunal. SM : Para terminar, relativamente ao bombardeamento da ponte de Kerch na Crimeia, como jurista pensa que este \u00e9 um alvo militar leg\u00edtimo, dado que estamos no meio de uma guerra e este \u00e9 um territ\u00f3rio ocupado? Karim Khan : N\u00e3o vou comentar sobre isso porque na verdade nem sequer sei o que aconteceu. 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“A justiça internacional não é uma construção teórica” – Karim Khan

“A justiça internacional não é uma construção teórica” – Karim Khan
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“Estamos num momento muito crítico. Quando falamos sobre armas nucleares táticas, não é apenas uma zona de penumbra [Twilight Zone], é a véspera de um pesadelo. Precisamos de levar o assunto muito a sério. Acho que a lei tem um papel a desempenhar. Isto não é um filme de Hollywood.”

Estamos perante mais uma escalada violenta da guerra na Ucrânia, incluindo ataques contra alvos civis. Existem fortes apelos à justiça internacional, tanto para os crimes de guerra cometidos em território ucraniano como para a dissuasão.

O procurador-geral do Tribunal Penal Internacional (TPI) em Haia, Karim Khan, é o nosso convidado desta edição do Global Conversation.

Shona Murray, euronews: À luz dos acontecimentos dos últimos dias, do que vimos em Bucha, da decisão da Comissão das Nações Unidas para os Direitos Humanos de investigar 30 cidades, onde encontraram provas de execuções e de violação, mesmo de crianças de quatro anos e de adultos nos seus oitenta, qual é o papel do TPI no julgamento destes crimes graves?

Karim Khan: O papel do procedimento penal é garantir que haja responsabilização, que não haja refúgio para a impunidade, que não exista uma crença crescente de que tudo pode acontecer, que os actos criminosos tenham consequências. Isso exige que estejamos presentes. Exige que investiguemos e apuremos a verdade e depois que tenhamos persistência para usar os trâmites do tribunal para apresentar casos aos juízes independentes para que estes sejam revistos, se determinarmos que foram cometidos crimes.

SM: A Ucrânia acusou algumas pessoas nos seus tribunais nacionais. Quando veremos os generais, soldados e militares responsáveis por esses crimes num tribunal?

Karim Khan: Bem, isso depende das provas. Mas certamente, como disse antes da minha eleição e de começar o meu mandato em junho do ano ado, temos a responsabilidade de mostrar que a justiça internacional não é uma construção teórica. Na verdade, é sentida pelas vítimas e aqueles que mais precisam da lei, os mais vulneráveis, as crianças, as mulheres e os homens que são civis, que estão a sofrer muito, certamente na Ucrânia , mas também em muitas outras partes do mundo. Ou seja, estou bastante ciente do facto de que a justiça internacional não pode ser vista como um exercício histórico de investigação de alegações adas de interesse histórico.

SM: Prevê um tribunal aqui em Haia, em complemento ao sistema judicial nacional da Ucrânia? É assim que vai ser? Esse é o apelo que está a ser feito neste momento, algo como o que vimos na Jugoslávia, Ruanda, entre outros.

Karim Khan: O princípio da complementaridade é certamente um princípio fundamental. Nesse sentido, tivemos uma cooperação muito boa com as autoridades da Ucrânia. Estamos a trabalhar de perto com elas. Estamos a conduzir as nossas investigações de forma independente porque, é claro, temos uma certa arquitetura legal que a Ucrânia não tem. Temos provisões para genocídio, crimes de guerra, crimes contra a humanidade. Temos a capacidade de acusar não apenas os autores diretos, as pessoas acusadas de violar, matar ou bombardear, mas também os seus superiores, militares ou políticos. Esse é um instrumento legal que temos ao abrigo do Estatuto de Roma, e vamos usá-lo se as provas assim o exigirem.

A justiça internacional não pode ser vista como um exercício histórico de investigação de alegações adas de interesse histórico.
Karim Khan

SM: Referiu nas Nações Unidas que isto são, potencialmente, ecos de Nuremberga. Pensa que Vladimir Putin, o presidente da Rússia, por exemplo, pode acabar no tribunal de crimes de guerra aqui em Haia?

Karim Khan: Bem, Nuremberga tornou claro que nem as ordens de superiores, nem o cargo oficial de um indivíduo como general, como presidente ou como primeiro-ministro, constituem uma defesa, um argumento para a imunidade. O Tribunal Penal Internacional, como tribunal internacional reconhecido pelo Conselho de Segurança, utilizado pelo Conselho de Segurança no Sudão, na Líbia, e noutros casos, tem competência para lidar com qualquer indivíduo que tenha cometido crimes ou tenha impedido ou deixado de punir crimes sob a nossa jurisdição.

SM: Isso também significaria a sua imunidade no caso de qualquer acordo de paz ou solução negociada entre a Ucrânia e a Rússia.

Karim Khan: Bem, não existe imunidade para crimes internacionais. Para além disso, como sabe, um dos princípios de Nuremberga é que não há prescrição para crimes de guerra ou crimes contra a humanidade, crimes que são Hostis humani generis, que violam os princípios básicos da nossa humanidade. Não pode haver um porto seguro para esses crimes e a lei tem um papel a desempenhar, nós faremos a nossa parte.

No momento em quando falamos sobre armas nucleares táticas, não é apenas uma zona de penumbra [Twilight Zone], é a véspera de um pesadelo. Precisamos de levar o assunto muito a sério. Acho que a lei tem um papel a desempenhar. Isto não é um filme de Hollywood.
Karim Khan

SM: Com base nas provas do Tribunal Penal Internacional, naquilo que viu pessoalmente, bem como na retórica da Rússia, de generais russos e outros, a que estamos a ouvir, muitos especialistas jurídicos afirmam que se trata de uma ideologia genocida. Isto é algo que sente que poderá ser investigado?

Karim Khan: Estamos num momento muito crítico, um momento em que os líderes falam sobre usar violência, usar bombas, usar armas. É uma questão de parar e pensar para onde nos dirigimos. No momento em quando falamos sobre armas nucleares táticas, não é apenas uma zona cinzenta, é a véspera de um pesadelo. Precisamos de levar o assunto muito a sério. Acho que a lei tem um papel a desempenhar. Isto não é um filme de Hollywood. Isto não é uma espécie de drama. Isto é algo muito próximo e pessoal para muitos. Para os ucranianos que estão agora espalhados pela Europa, que estão fora das suas casas, que estão separados dos seus entes queridos. Para aqueles, como membros da minha equipa que estão em Kiev, que estão abrigados no subsolo e se perguntam quando serão atingidos pelo próximo míssil. Estes civis merecem toda a proteção.

SM: Nesse caso, qual é o processo se houver evidência de violação da Convenção de Genebra por indivíduos específicos? Existe um procedimento para que essas pessoas possam ser presas em território russo ou em território ucraniano?

Karim Khan: Não vou entrar em nenhum cenário específico mas certamente é bem conhecido - e vimos isso na ex-Jugoslávia, em Ruanda, no Tribunal Penal Internacional - que se eu determinar após investigações que há motivos para acreditar que um indivíduo cometeu crimes, posso requerer um mandado. Os juízes determinarão se esses motivos são ou não suficientes, e depois segue-se uma fase de avaliação das possibilidades de opção de captura. Ou então as pessoas entregam-se voluntariamente. Tivemos chefes de estado que se renderam voluntariamente perante este tribunal.

SM: Para terminar, relativamente ao bombardeamento da ponte de Kerch na Crimeia, como jurista pensa que este é um alvo militar legítimo, dado que estamos no meio de uma guerra e este é um território ocupado?

Karim Khan: Não vou comentar sobre isso porque na verdade nem sequer sei o que aconteceu. Li relatos, que são informação pública, sobre uma série de cenários, desde o de acidente ao de sabotagem e a uma variedade de questões.

Mas, em termos de o que esse ataque pode constituir - sei que seria aliciante opinar neste programa sobre se essa instância pode ou não ser um crime ou pode ou não ser um alvo legítimo - uma coisa é clara: não se pode atingir deliberadamente, intencionalmente, alvos civis, escolas e hospitais, locais de residência de civis, a menos que estes estejam a ser utilizados para obter uma vantagem militar precisa e, mesmo assim, há uma regra de proporcionalidade. Isto é aplicável e, claro, pode ser extrapolado para uma variedade de outros alvos, sejam pontes ou locais de energia. Mas espalhar o terror não é permitido.

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