{ "@context": "https://schema.org/", "@graph": [ { "@type": "NewsArticle", "mainEntityOfPage": { "@type": "Webpage", "url": "/2015/09/25/ha-pessoas-que-a-medida-que-envelhecem-ficam-ainda-mais-bonitas-do-que-quando" }, "headline": "\u0022H\u00e1 pessoas que, \u00e0 medida que envelhecem, ficam ainda mais bonitas do que quando jovens\u0022, Jean Paul Gaultier", "description": "Ele revolucionou a moda com a sua forma de agir provocadora. Conta com quarenta anos de carreira que celebra com uma exposi\u00e7\u00e3o que percorre o mundo", "articleBody": "Ele revolucionou a moda com a sua forma de agir provocadora. Conta com quarenta anos de carreira que celebra com uma exposi\u00e7\u00e3o que percorre o mundo. Biografia: Jean Paul Gaultier Jean Paul Gaultier nasceu em 1952 num sub\u00farbio de Paris A sua rela\u00e7\u00e3o com a sua av\u00f3 foi fundamental para a sua carreira na moda Desde sempre que mostrou talento, fazendo esbo\u00e7os de moda No seu 18\u00ba anivers\u00e1rio foi contratado por Pierre Cardin, apesar de ter n\u00e3o ter estudado moda Ficou conhecido como o \u201cenfant terrible\u201d da moda por desafiar a vis\u00e3o padr\u00e3o da moda Entre as suas pe\u00e7as mais emblem\u00e1ticas est\u00e1 o suti\u00e3 c\u00f3nico que Madonna usou na \u2018Blonde Ambition tour\u2019 Este ano abandonou a carreira no pronto-a-vestir para se concentrar na Alta-costura Isabel Kumar, euronews: Estamos em Munique, na Alemanha com Jean Paul Gaultier. Esta exposi\u00e7\u00e3o conta a sua hist\u00f3ria, as suas cria\u00e7\u00f5es tornaram-se pe\u00e7as de museu, como se sente ao ver o seu trabalho exposto desta maneira? Jean Paul Gaultier: Para ser franco, e ao contr\u00e1rio do que se poderia imaginar, n\u00e3o sinto nenhuma nostalgia ou tristeza, num sentido rom\u00e2ntico. S\u00e3o lembran\u00e7as, mas n\u00e3o tenho tempo de pensar em recorda\u00e7\u00f5es. O que tento fazer \u00e9 ver este momento como uma nova aventura. O que fa\u00e7o \u00e9 olhar para as antigas cria\u00e7\u00f5es e tento fazer com que o significado que eu sempre quis que tivessem seja claro, tento que sejam vistas do melhor \u00e2ngulo poss\u00edvel e que haja coer\u00eancia. Fa\u00e7o um trabalho de adapta\u00e7\u00e3o de acordo com cada cidade por onde a a exposi\u00e7\u00e3o. Euronews: Mas n\u00e3o afirmou, numa determinada ocasi\u00e3o, que para ver as suas cria\u00e7\u00f5es num museu era preciso estar morto? Jean Paul Gaultier: \u00c9 verdade, \u00e9 por isso que eu n\u00e3o quis fazer uma exposi\u00e7\u00e3o para um museu mas sim uma exposi\u00e7\u00e3o alegre e viva. \u00c9 por isso que, para mim, era primordial ter, desde o momento em que vi a equipa de Montreal, que se ofereceu para fazer esta exposi\u00e7\u00e3o, uma equipa muito din\u00e2mica, e foi por isso que lhes perguntei se podia ter manequins, porque para mim os manequins\u2026 Euronews: Sim, h\u00e1 rostos que falam, \u00e9 fant\u00e1stico. Jean Paul Gaultier: Exato. Eu vi um espet\u00e1culo chamado \u00abLes Aveugles\u00bb, um espet\u00e1culo do canadiano Denis Marleau, que colocava em cena monges que falavam \u2013 monges homem e mulheres, religiosos \u2013 e no final aperceb\u00edamo-nos que n\u00e3o era real, era apenas uma proje\u00e7\u00e3o, ou seja, um sonho. Ent\u00e3o pensei pedir a Denis Marleau se queria fazer-me essas proje\u00e7\u00f5es, porque se costuma dizer que as manequins n\u00e3o sabem falar que se limitam a ser bonitas mas isso n\u00e3o \u00e9 verdade. Portanto decidimos p\u00f4-las a falar e elas falam muito bem. Euronews: Pedimos aos nossos internautas para nos enviarem perguntas, recebemos muitas. Steven Davis pergunta: sente-se orgulhoso daquilo que j\u00e1 alcan\u00e7ou? Jean Paul Gaultier: Eu diria que, em geral, aquilo de que sinto mais orgulho \u00e9 o facto de me ter mantido fiel a mim mesmo, eu escolhi esta profiss\u00e3o quando era crian\u00e7a, depois de ver um filme chamado \u2018Falbalas\u2019, foi ele que me mostrou o caminho. Eu queria fazer desfiles, moda, mas o que me chamou a aten\u00e7\u00e3o foram os desfiles no filme: as manequins que caminhavam e que eram como hero\u00ednas. Mas quando eu era pequeno, eu mentia, porque fazer esse trabalho n\u00e3o era muito bem aceite, porque eu jogava mal futebol, mas um dia ao fazer este trabalho, disse-me a mim mesmo que n\u00e3o podia continuar a mentir, aquele era o meu sonho de inf\u00e2ncia. Euronews: Voltemos \u00e0 sua inf\u00e2ncia, porque o conceito de musa \u00e9 importante para si e temos aqui a sua primeira musa. N\u00e3o quero ofend\u00ea-lo mas ela n\u00e3o \u00e9 muito bonita, n\u00e3o foi uma escolha muito\u2026 Jean Paul Gaultier: Estava a ver como ia abordar a quest\u00e3o, pretende insultar o meu urso? Euronews: Ela chama-se Nana, fale-nos dela. Jean Paul Gaultier: A Nan\u00e1. Eu queria vestir\u2026 eu queria uma boneca, mas meus pais pensavam que para um rapaz talvez n\u00e3o fosse o melhor. Portanto eu fiz implantes mam\u00e1rios ao meu urso, ou seja, criei seios c\u00f3nicos com papel\u00e3o. Euronews: Os primeiros seios c\u00f3nicos\u2026 Jean Paul Gaultier: Dizem que os criei para a Madonna mas n\u00e3o. Criei-os para o meu urso. Depois usei-os numa cole\u00e7\u00e3o em 81, quando comecei a fazer espartilhos, vestidos com espartilhos, e isso \u00e9 outra coisa que devo \u00e0 minha av\u00f3, porque a minha av\u00f3 tinha um espartilho, parece que para ter uma cintura fina, quando ela vestia o espartilho, quando era jovem, bebia vinagre antes de puxar os cord\u00f5es, claro que era preciso contrair o est\u00f4mago, e assim conseguia ficar mais delgada. Euronews: Um instrumento de tortura transformado num instrumento de\u2026 Jean Paul Gaultier: ...sedu\u00e7\u00e3o. Euronews: Sim, de sedu\u00e7\u00e3o. Jean Paul Gaultier: E o paradoxo \u00e9 que eu cheguei num momento em que o feminismo se afirmava, em que as mulheres deitavam fora os suti\u00e3s, como sinal de liberdade, queimavam os suti\u00e3s, mas havia outras mulheres, talvez as filhas, que, ao contr\u00e1rio, queriam seduzir, mas como uma escolha, n\u00e3o enquanto objeto. Eu transformei o homem no objeto, \u00e9 ele o objeto. O meu primeiro desfile masculino centrou-se no homem enquanto objeto. Euronews: Regressemos \u00e0 sua av\u00f3, porque ela foi muito importante para si, descobriu atrav\u00e9s dela o espartilho mas tamb\u00e9m a costura, a maquilhagem, o mundo das mulheres. O que \u00e9 que o fascina nesse mundo? Jean Paul Gaultier: Eu achei sempre que as raparigas, mesmo na escola, eram muito mais interessantes do que os rapazes, \u00e9 verdade, com a mesma idade, elas tinham interesses mais pr\u00f3ximos dos meus e faziam-me descobrir muito mais coisas que os rapazes que pensavam apenas em jogar futebol, eu sei que digo sempre alguma coisa contra o futebol mas foi isso que aconteceu. Eu sentia-me muito feliz e muito bem com elas e minha av\u00f3 dava-me total liberdade. Como eu era filho \u00fanico, eu ficava em casa dela \u00e0s quintas-feiras, o dia em que n\u00e3o havia escola, e podia ver a televis\u00e3o que quisesse, at\u00e9 ver coisas que n\u00e3o eram para crian\u00e7as, que eram proibidas \u00e0s crian\u00e7as, eu via todos esses programas. Eu descobri o espartilho, vi as penas negras da ave-do-para\u00edso: foi fant\u00e1stico. Descobri um mundo que eu n\u00e3o conhecia e que me fez sonhar. Euronews: A sua fam\u00edlia \u00e9 uma fam\u00edlia digamos normal\u2026 Jean Paul Gaultier: Sim, da classe m\u00e9dia sa. Euronews: Cresceu num bairro social\u2026 Jean Paul Gaultier: Num bairro social de uma cidade comunista, Arcueil, nos sub\u00farbios da capital, mas podia sonhar, pensar em outra coisa e foi assim que fui enriquecendo o meu mundo de sonho\u2026 Euronews: E o que \u00e9 que os seus pais pensavam disso? A sua m\u00e3e era caixa, se n\u00e3o estou enganada, o seu pai trabalhava em contabilidade, mas voc\u00ea era uma crian\u00e7a bastante exc\u00eantrica. Jean Paul Gaultier: Eles n\u00e3o tinham medo. Eles deixavam-me desenhar, eu n\u00e3o andei numa escola de moda. Eu lia as revistas, eu aprendi, de facto, a moda, atrav\u00e9s da imprensa, descobri-a pouco a pouco. No in\u00edcio era como ler a B\u00edblia, era preciso questionar aquilo que me estavam a dizer, cada vez mais. Foi assim que comecei a aprender. E eu praticava tentando imitar. Por exemplo, li que Cardin, Pierre Cardin, \u201capresentou hoje a sua cole\u00e7\u00e3o de alta-costura, ele fez 300 modelos\u201d, ent\u00e3o em pensei: \u201cbem, vou fazer 301, 302\u2026\u201d. E entrei para a casa Cardin aos 18 anos. Isto porque os meus pais mostraram os meus esbo\u00e7os a um vizinho, cuja ex-mulher era ilustradora da revista \u201cLe Petit \u00c9cho de la Mode\u201d, ela viu-os e disse: \u201cSim \u00e9 preciso que ele fa\u00e7a algo com isto\u2026\u201d Euronews: E enviou-os para Pierre Cardin? Jean Paul Gaultier: Para todos os costureiros e recebi resposta de Pierre Cardin, que me contratou no dia em que fiz 18 anos. Fui com a minha m\u00e3e, porque tinha recebido um telefonema e eu estava com medo de ir sozinho\u2026 Ela esperou-me na entrada do pr\u00e9dio, na Place Beauveau, eu falei com ele, disse-lhe que ainda andava na escola, ele perguntou-me quando \u00e9 que eu podia vir? Eu disse-lhe, \u201cesta tarde, esta tarde e esta tarde\u201d e ele respondeu-me \u201ctudo bem, est\u00e1 contratado.\u201d Euronews: Nos dias de hoje s\u00e3o poss\u00edveis hist\u00f3rias como a sua, no mundo da moda? Jean Paul Gaultier: Penso que se quisermos podemos. Euronews: A s\u00e9rio? Jean Paul Gaultier: Sim, penso que as coisas se fazem de outra maneira, \u00e9 preciso adaptarmo-nos \u00e0 realidade, agora h\u00e1 a internet, algo que n\u00e3o existia, por isso, as formas de comunica\u00e7\u00e3o s\u00e3o diferentes, mas penso que h\u00e1 sempre sonhos poss\u00edveis de concretizar. Quando acreditamos, verdadeiramente, penso que amos por uma s\u00e9rie de coisas mas que acabamos por conseguir. Penso que o conceito de imposs\u00edvel n\u00e3o \u00e9 franc\u00eas. Euronews: Trabalha que nem um mouro. Diz-se que tem, todos os dias, uma nova obsess\u00e3o. Qual \u00e9 a sua obsess\u00e3o de hoje? Jean Paul Gaultier: Hoje, se quiser, larguei o pronto-a-vestir. Durante 40 anos fiz pronto-a-vestir, muito bem, esse mundo mudou, temos menos liberdade criativa do que t\u00ednhamos antigamente, e eu tive oportunidade de conhecer a verdadeira liberdade. Naturalmente que, de alguma forma, eu continuei a t\u00ea-la. Mas reformei-me do pronto-a-vestir mas continuarei a nesta profiss\u00e3o e farei outros projetos. Euronews: Isso leva-me \u00e0 pergunta de Patrick Hamon: \u201cQuando \u00e9 que se vai reformar?\u201d Jean Paul Gaultier: Deixe-me dizer-lhe uma coisa: eu comecei a trabalhar antes mesmo de ter um trabalho. Portanto, se um dia eu j\u00e1 n\u00e3o conseguir mexer-me se n\u00e3o conseguir fazer mais nada, poderei sempre fazer os meus pequenos esbo\u00e7os, ou imagin\u00e1-los, poderei sempre pedir a algu\u00e9m que mos desenhe, por prazer\u2026 Euronews: Voltando \u00e0 sua carreira e a Madonna, outra musa importante para si. Desenvolveu la\u00e7os fortes \u00e0 volta dos seus seios c\u00f3nicos, mas o que \u00e9 que o atraiu nela? Jean Paul Gaultier: Penso que \u00e9ramos g\u00e9meos, num determinado sentido. No sentido de que ela era a mulher que mostrava aquilo que eu representava nas minhas cria\u00e7\u00f5es. Ou seja, fatos bastante masculinos mas com espartilhos por dentro. Uma esp\u00e9cie de poder e sedu\u00e7\u00e3o ao mesmo tempo. Era, exatamente, isso que ela encarnava. Euronews: \u00c9 verdade que a pediu em casamento? Jean Paul Gaultier: Tr\u00eas vezes. Ela recusou todas e acho que foi melhor assim. Euronews: Sim e isso \u00e9 interessante, porque \u00e9 que a pediu em casamento? Sem querer entrar em detalhes pessoais\u2026 Jean Paul Gaultier: Foi mais um ato simb\u00f3lico\u2026 tinha a ver com essa aproxima\u00e7\u00e3o de pontos de vista que t\u00ednhamos sobre as coisas\u2026 a sexualidade\u2026 a rela\u00e7\u00e3o entre homens e mulheres\u2026 As parecen\u00e7as eram de tal forma grandes que eu as via como um fim. E para mim a coisa mais linda que eu podia fazer era pedi-la em casamento \u2013 Talvez n\u00e3o para ela. Ali\u00e1s ela experimentou-o e divorciou-se duas vezes. Euronews: Mas a quest\u00e3o da sexualidade\u2026 seria um casamento plat\u00f3nico\u2026 Jean Paul Gaultier: Bem, isso eu n\u00e3o sei porque, no final das contas, ela era muito \u2018macho\u2019... E eu gosto disso! Euronews: Anna Karen pergunta: \u201cdas modelos e atrizes que j\u00e1 vestiram as suas cria\u00e7\u00f5es qual \u00e9 a que prefere?\u201d Jean Paul Gaultier: A minha atriz preferida \u00e9, obviamente, Micheline Presle, foi ela que me fez escolher esta profiss\u00e3o depois de ver o filme \u2018Falbalas\u2019... Evidentemente que h\u00e1 musas, como Catherine Deneuve, que representam a mulher parisiense. Em \u00faltima an\u00e1lise, iro sobretudo as pessoas que t\u00eam o seu pr\u00f3prio universo e, por vezes, n\u00e3o s\u00e3o, exatamente, iguais \u00e0 imagem que temos delas. Por exemplo, Catherine Deneuve que, para l\u00e1 do seu aspeto frio e g\u00e9lido \u00e9, sabe-se bem, aberta e curiosa a muitas coisas\u2026 Eu amo a diferen\u00e7a. Euronews: A imperfei\u00e7\u00e3o \u00e9 tamb\u00e9m algo que o atrai\u2026 Jean Paul Gaultier: Sim, mas o que \u00e9 a imperfei\u00e7\u00e3o? Esta \u00e9 uma outra maneira de ver as coisas\u2026 Rossy de Palma, por exemplo, com o seu nariz, com o seu f\u00edsico absolutamente\u2026 como ela pr\u00f3pria diz \u00e9 uma esp\u00e9cie de Picasso vivo\u2026 um quadro de Picasso, um personagem de Picasso\u2026 eu penso que n\u00e3o existe apenas uma forma de beleza, h\u00e1 muitas formas de beleza. E \u00e9 a intelig\u00eancia e a beleza do esp\u00edrito que sobressaem. Isto significa que h\u00e1 pessoas que, \u00e0 medida que envelhecem, ficam ainda mais bonitas do que quando jovens. Euronews: Ali\u00e1s tamb\u00e9m utiliza modelos j\u00e1 com uma certa idade\u2026 Jean Paul Gaultier: Com uma certa idade e peso tamb\u00e9m\u2026 N\u00e3o escolho apenas mulheres muito redondas, \u00e0s vezes escolho mulheres que s\u00e3o muito magras\u2026 Para mim n\u00e3o h\u00e1 uma lei, para mim n\u00e3o existe uma regra que diz: \u201c\u00e9 preciso ser como esta modelo\u201d. Felizmente que n\u00e3o, pelo contr\u00e1rio, devemos cultivar a diferen\u00e7a. Euronews: \u00c9 por isso que o vemos, de certa forma, como algu\u00e9m que democratizou a moda, mas o facto de se dedicar \u00e0 alta-costura n\u00e3o vai contra essa democratiza\u00e7\u00e3o? Jean Paul Gaultier: Penso que n\u00e3o\u2026 A alta-costura \u00e9 muita cara mas permite um trabalho de cria\u00e7\u00e3o que \u00e9 muito . Mas essa cria\u00e7\u00e3o pode permitir-nos vender outras coisas, \u00f3rios, perfumes, e mostrar imagens que fa\u00e7am com que as pessoas possam vestir Gaultier inspirando-se naquilo que eu fa\u00e7o. Euronews: Tem mais tempo livre, agora, o que vai fazer com ele? Jean Paul Gaultier: Eu giro muito mal o meu tempo, a minha agenda est\u00e1 sempre sobrecarregada. Tamb\u00e9m porque tenho novos projetos. Euronews: Quais s\u00e3o os seus novos projetos? Jean Paul Gaultier: Fazer figurinos para um espet\u00e1culo, uma revista\u2026 Talvez um dia fazer uma revista\u2026 Uma linha de roupa barata para o Jap\u00e3o, vou partir para o Jap\u00e3o, farei o mesmo na Austr\u00e1lia, a pre\u00e7os baixos\u2026 a democratiza\u00e7\u00e3o continua mas de uma outra maneira! Euronews: Infelizmente eu e muitas pessoas, n\u00e3o temos capacidade financeira para comprar numa loja Jean-Paul Gaultier, que dicas pode dar-nos para sermos chiques? Jean Paul Gaultier: A primeira coisa a fazer \u00e9 um trabalho individual, ou seja, aceitar-se a si pr\u00f3pria. Ver-se como se \u00e9. E tirar proveito das coisas que por vezes s\u00e3o vistas como\u2026 N\u00e3o se focar no negativo. Se se sentir de tal forma mal consigo pr\u00f3pria que sente necessidade de mudar a cor do cabelo, ou mesmo o nariz, colocar uma pr\u00f3tese na boca, se isso a fizer sentir-se melhor, tudo bem. O importante \u00e9 que seja voc\u00ea mesma, que se sinta bem com aquilo que fez ou que quer fazer a si pr\u00f3pria, no trabalho que quer fazer a si pr\u00f3pria. Ou n\u00e3o fazer nada e aceitar-se como \u00e9. Essa \u00e9 a coisa principal. Ent\u00e3o estar\u00e1 tudo bem. Pode vestir qualquer coisa, que tudo lhe cair\u00e1 bem. Euronews: Volto \u00e0 quest\u00e3o de deixar de fazer pronto-a-vestir. Foi um grande cr\u00edtico, em rela\u00e7\u00e3o \u00e0 moda atual\u2026 Jean Paul Gaultier: Ah sim? Fiz cr\u00edticas em que sentido? Euronews: Que a tudo muito r\u00e1pido que n\u00e3o temos tempo de inovar\u2026 Jean Paul Gaultier: Ah, mas isso n\u00e3o \u00e9 uma cr\u00edtica \u00e0 moda, ao vestu\u00e1rio, \u00e9 uma cr\u00edtica ao sistema. Sim, porque o que eu acho \u00e9 que estamos num per\u00edodo de crise e eu n\u00e3o acredito que fazer mais modelos, mais roupa, possa resolver as coisas. Tamb\u00e9m n\u00e3o acredito que ao oferecer uma pe\u00e7a de roupa a pessoas que podem compr\u00e1-la, como forma de fazer publicidade, seja bom para o neg\u00f3cio. Trabalhar, gratuitamente, n\u00e3o \u00e9 bom para ningu\u00e9m e isso aplica-se tamb\u00e9m \u00e0s pessoas que fazem a roupa. Euronews: Isso leva-me \u00e0 pr\u00f3xima pergunta, sobre responsabilidade social. Queira ou n\u00e3o tem, penso eu, uma certa responsabilidade social, enquanto criador de moda e celebridade. Houve uma s\u00e9rie de esc\u00e2ndalos relativos a f\u00e1bricas no Bangladeche e ao facto das pessoas serem tratadas como escravos. Isso afeta-o? Jean Paul Gaultier: Evidentemente que isso me afeta mas n\u00e3o sei qual \u00e9 a solu\u00e7\u00e3o. N\u00e3o sou pol\u00edtico. Nem pol\u00edtico nem economista, por isso n\u00e3o sei qual poder\u00e1 ser a solu\u00e7\u00e3o. Euronews: Quando fala do Jap\u00e3o e do pronto-a-vestir mais barato, sabe onde s\u00e3o fabricados os tecidos, as pe\u00e7as de roupa? Jean Paul Gaultier: Evidentemente, sei que h\u00e1 muitas coisas que s\u00e3o feitas na China, \u00e9 \u00f3bvio. Eu observo, sinto tudo isso e n\u00e3o tenho nenhuma solu\u00e7\u00e3o. Infelizmente, essa pergunta n\u00e3o me deve ser colocada a mim. S\u00e3o esses senhores pol\u00edticos que devem mexer o rabo! Euronews: Vivendo nesse mundo exc\u00eantrico que \u00e9 o da moda, como consegue manter os p\u00e9s na terra? Jean Paul Gaultier: Eu n\u00e3o frequento esse mundo. Eu trabalho, fa\u00e7o aquilo de que gosto, mas estou a trabalhar. Talvez isso me salvaguarde, me preserve. Euronews: Uma quest\u00e3o de Petro Brits: \u201cQual foi a coisa mais importante que aprendeu na sua carreira?\u201d Porque ela \u00e9 diversificada. Jean Paul Gaultier: At\u00e9 editei um disco, que n\u00e3o foi, de maneira nenhuma, um sucesso, \u00e9 preciso diz\u00ea-lo. Mas sim, fiz uma s\u00e9rie de coisas diferentes, algumas que nunca pensei fazer. Em \u00faltima an\u00e1lise, todas estas aventuras tamb\u00e9m me ajudaram a superar a minha timidez, porque mesmo que n\u00e3o se perceba eu sou muito t\u00edmido e fui obrigado a \u2018desenrascar-me\u2019. Quando nos atiramos \u00e0 \u00e1gua \u00e9 preciso nadar. Euronews: Como v\u00ea o seu legado? Jean Paul Gaultier: Eu n\u00e3o penso no meu legado. Ainda n\u00e3o fui ao not\u00e1rio. Euronews: O que \u00e9 que vai deixar ao mundo da moda? N\u00e3o que esteja a tentar enterr\u00e1-lo\u2026 Jean Paul Gaultier: O museu j\u00e1 existe! \u00c9 assim que come\u00e7a! Bem, n\u00e3o sei\u2026 O que eu tentei foi alargar, um pouco, os horizontes das pessoas e ajud\u00e1-las a entenderem que n\u00e3o h\u00e1 uma forma de beleza, h\u00e1 m\u00faltiplas formas de beleza. Euronews: Uma quest\u00e3o de Ekaterina Shamakanova: \u201co que \u00e9 para si a felicidade?\u201d Jean Paul Gaultier: (deixar a interjei\u00e7\u00e3o) A felicidade? Sabendo que eu trabalho como um louco, mas que, para mim, isso n\u00e3o \u00e9 trabalho mas felicidade, tenho de diz\u00ea-lo\u2026 por vezes \u00e9 apenas um estado de contempla\u00e7\u00e3o. Ou seja, eu posso estar na cama a ver televis\u00e3o e a comer esparguete! Isso pode ser felicidade! Eu posso estar na Gr\u00e9cia, a observar Santorini, o vulc\u00e3o, o sil\u00eancio e tudo isso \u00e9 lindo! Momentos como esses. A felicidade \u00e9 tamb\u00e9m a surpresa\u2026 qualquer coisa de que n\u00e3o estou \u00e0 espera, mas penso que \u00e9 igual com toda a gente, n\u00e3o h\u00e1 nada mais bonito do que uma surpresa, pois n\u00e3o? Pensa-se em qualquer coisa, tudo corre bem, e de repente, num estalar de dedos, acontece algo inesperado e que \u00e9 formid\u00e1vel. Euronews: E envelhecer, preocupa-o? Em alguns dos seus cartazes os seus tra\u00e7os est\u00e3o suavizados, parece Jean-Paul Gaultier h\u00e1 20 anos\u2026 Jean Paul Gaultier: Exatamente! Mas isso \u00e9 trabalho de Pierre & Gilles, eles s\u00e3o os melhores cirurgi\u00f5es pl\u00e1sticos! Al\u00e9m disso, n\u00e3o \u00e9 necess\u00e1ria anestesia s\u00e3o eles que fazem desaparecer tudo e fica impec\u00e1vel! Tive a sorte de ter uma av\u00f3 excecional e que amei muito. E, para mim, a velhice representa bondade, felicidade e beleza e tamb\u00e9m amor. Por isso envelhecer n\u00e3o me assusta. Euronews: H\u00e1 alguma lembran\u00e7a da sua av\u00f3, da sua inf\u00e2ncia, que mant\u00e9m o seu cora\u00e7\u00e3o quente quando est\u00e1 longe da sua fam\u00edlia, do seu ambiente social, dos seus amigos\u2026 Jean Paul Gaultier: Sim! Voltando \u00e0 quest\u00e3o da velhice: a minha av\u00f3 tinha cabelos brancos, muito branco, eram muito bonitos. Ela queria pintar o cabelo mas apenas para tirar aquele tom amarelado que fica no cabelo branco. Eu queria faz\u00ea-lo e ent\u00e3o fi-lo. Eu tinha os produtos que ela tinha comprado, tinha sete ou oito anos, e apliquei-os. Mas, na minha cabe\u00e7a, eu queria que ela tivesse o cabelo mais escuro, para torn\u00e1-la mais jovem. V\u00ea? Aos sete ou oito anos eu n\u00e3o queria que ela aparentasse a idade que tinha e, por isso, deixei mais tempo o produto pensando que isso iria escurecer o cabelo dela e que iria ficar preto, mas n\u00e3o, de todos, ficou violeta! Lembro-me que ela estava furiosa e eu dizia: \u201cn\u00e3o, eu n\u00e3o sei o que aconteceu!\u201d, Mas na verdade tinha sido eu que em vez de 5, 10 minutos, tinha deixado meia hora. Ela n\u00e3o tinha a no\u00e7\u00e3o do tempo. E depois, como ela estava enervada, pegou numa frigideira e come\u00e7ou a bater na mesa com ela para n\u00e3o me dar uma estalada. Foi muito engra\u00e7ado! \u00c9 uma bela lembran\u00e7a que me aquece! No final, por amor, ela estragou a ca\u00e7arola com o seu cabelo violeta! Euronews: V\u00ea a vida com humor\u2026 Jean Paul Gaultier: Eu acho que isso \u00e9 \u00f3timo, n\u00e3o? De qualquer forma, \u00e9 bom rir\u2026 \u00c9 necess\u00e1rio, penso que \u00e9 vital. Isto merece um bom bife ou ent\u00e3o tornar-me vegetariano!", "dateCreated": "2015-09-25T14:30:58+02:00", "dateModified": "2015-09-25T14:30:58+02:00", "datePublished": "2015-09-25T14:30:58+02:00", "image": { "@type": "ImageObject", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Farticles%2F314018%2F1440x810_314018.jpg", "width": "1440px", "height": "810px", "caption": "Ele revolucionou a moda com a sua forma de agir provocadora. Conta com quarenta anos de carreira que celebra com uma exposi\u00e7\u00e3o que percorre o mundo", "thumbnail": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Farticles%2F314018%2F432x243_314018.jpg", "publisher": { "@type": "Organization", "name": "euronews", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Fwebsite%2Fimages%2Feuronews-logo-main-blue-403x60.png" } }, "author": { "@type": "Organization", "name": "Euronews", "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ], "url": "/" }, "publisher": { "@type": "Organization", "name": "Euronews", "legalName": "Euronews", "url": "/", "logo": { "@type": "ImageObject", "url": "https://image.staticox.com/?url=https%3A%2F%2Fstatic.euronews.com%2Fwebsite%2Fimages%2Feuronews-logo-main-blue-403x60.png", "width": "403px", "height": "60px" }, "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ] }, "articleSection": [ "Mundo" ], "isAccessibleForFree": "False", "hasPart": { "@type": "WebPageElement", "isAccessibleForFree": "False", "cssSelector": ".poool-content" } }, { "@type": "WebSite", "name": "Euronews.com", "url": "/", "potentialAction": { "@type": "SearchAction", "target": "/search?query={search_term_string}", "query-input": "required name=search_term_string" }, "sameAs": [ "https://www.facebook.com/pt.euronews", "https://twitter.com/euronewspt", "https://flipboard.com/@euronewspt", "https://www.linkedin.com/company/euronews" ] } ] }

"Há pessoas que, à medida que envelhecem, ficam ainda mais bonitas do que quando jovens", Jean Paul Gaultier

"Há pessoas que, à medida que envelhecem, ficam ainda mais bonitas do que quando jovens", Jean Paul Gaultier
Direitos de autor 
De Euronews
Publicado a
Partilhe esta notíciaComentários
Partilhe esta notíciaClose Button
Copiar/colar o link embed do vídeo:Copy to clipboardCopied

Ele revolucionou a moda com a sua forma de agir provocadora. Conta com quarenta anos de carreira que celebra com uma exposição que percorre o mundo

Ele revolucionou a moda com a sua forma de agir provocadora. Conta com quarenta anos de carreira que celebra com uma exposição que percorre o mundo.

Biografia: Jean Paul Gaultier

  • Jean Paul Gaultier nasceu em 1952 num subúrbio de Paris
  • A sua relação com a sua avó foi fundamental para a sua carreira na moda
  • Desde sempre que mostrou talento, fazendo esboços de moda
  • No seu 18º aniversário foi contratado por Pierre Cardin, apesar de ter não ter estudado moda
  • Ficou conhecido como o “enfant terrible” da moda por desafiar a visão padrão da moda
  • Entre as suas peças mais emblemáticas está o sutiã cónico que Madonna usou na ‘Blonde Ambition tour’
  • Este ano abandonou a carreira no pronto-a-vestir para se concentrar na Alta-costura

Isabel Kumar, euronews:

Estamos em Munique, na Alemanha com Jean Paul Gaultier. Esta exposição conta a sua história, as suas criações tornaram-se peças de museu, como se sente ao ver o seu trabalho exposto desta maneira?

Jean Paul Gaultier:

Para ser franco, e ao contrário do que se poderia imaginar, não sinto nenhuma nostalgia ou tristeza, num sentido romântico. São lembranças, mas não tenho tempo de pensar em recordações. O que tento fazer é ver este momento como uma nova aventura. O que faço é olhar para as antigas criações e tento fazer com que o significado que eu sempre quis que tivessem seja claro, tento que sejam vistas do melhor ângulo possível e que haja coerência. Faço um trabalho de adaptação de acordo com cada cidade por onde a a exposição.

Euronews:

Mas não afirmou, numa determinada ocasião, que para ver as suas criações num museu era preciso estar morto?

Jean Paul Gaultier:

É verdade, é por isso que eu não quis fazer uma exposição para um museu mas sim uma exposição alegre e viva. É por isso que, para mim, era primordial ter, desde o momento em que vi a equipa de Montreal, que se ofereceu para fazer esta exposição, uma equipa muito dinâmica, e foi por isso que lhes perguntei se podia ter manequins, porque para mim os manequins…

Euronews:

Sim, há rostos que falam, é fantástico.

Jean Paul Gaultier:

Exato. Eu vi um espetáculo chamado «Les Aveugles», um espetáculo do canadiano Denis Marleau, que colocava em cena monges que falavam – monges homem e mulheres, religiosos – e no final apercebíamo-nos que não era real, era apenas uma projeção, ou seja, um sonho. Então pensei pedir a Denis Marleau se queria fazer-me essas projeções, porque se costuma dizer que as manequins não sabem falar que se limitam a ser bonitas mas isso não é verdade. Portanto decidimos pô-las a falar e elas falam muito bem.

Euronews:

Pedimos aos nossos internautas para nos enviarem perguntas, recebemos muitas. Steven Davis pergunta: sente-se orgulhoso daquilo que já alcançou?

Jean Paul Gaultier:

Eu diria que, em geral, aquilo de que sinto mais orgulho é o facto de me ter mantido fiel a mim mesmo, eu escolhi esta profissão quando era criança, depois de ver um filme chamado ‘Falbalas’, foi ele que me mostrou o caminho. Eu queria fazer desfiles, moda, mas o que me chamou a atenção foram os desfiles no filme: as manequins que caminhavam e que eram como heroínas. Mas quando eu era pequeno, eu mentia, porque fazer esse trabalho não era muito bem aceite, porque eu jogava mal futebol, mas um dia ao fazer este trabalho, disse-me a mim mesmo que não podia continuar a mentir, aquele era o meu sonho de infância.

Euronews:

Voltemos à sua infância, porque o conceito de musa é importante para si e temos aqui a sua primeira musa. Não quero ofendê-lo mas ela não é muito bonita, não foi uma escolha muito…

Jean Paul Gaultier:

Estava a ver como ia abordar a questão, pretende insultar o meu urso?

Euronews:

Ela chama-se Nana, fale-nos dela.

Jean Paul Gaultier:

A Naná. Eu queria vestir… eu queria uma boneca, mas meus pais pensavam que para um rapaz talvez não fosse o melhor. Portanto eu fiz implantes mamários ao meu urso, ou seja, criei seios cónicos com papelão.

Euronews:

Os primeiros seios cónicos…

Jean Paul Gaultier:

Dizem que os criei para a Madonna mas não. Criei-os para o meu urso. Depois usei-os numa coleção em 81, quando comecei a fazer espartilhos, vestidos com espartilhos, e isso é outra coisa que devo à minha avó, porque a minha avó tinha um espartilho, parece que para ter uma cintura fina, quando ela vestia o espartilho, quando era jovem, bebia vinagre antes de puxar os cordões, claro que era preciso contrair o estômago, e assim conseguia ficar mais delgada.

Euronews:

Um instrumento de tortura transformado num instrumento de…

Jean Paul Gaultier:

…sedução.

Euronews:

Sim, de sedução.

Jean Paul Gaultier:

E o paradoxo é que eu cheguei num momento em que o feminismo se afirmava, em que as mulheres deitavam fora os sutiãs, como sinal de liberdade, queimavam os sutiãs, mas havia outras mulheres, talvez as filhas, que, ao contrário, queriam seduzir, mas como uma escolha, não enquanto objeto. Eu transformei o homem no objeto, é ele o objeto. O meu primeiro desfile masculino centrou-se no homem enquanto objeto.

Euronews:

Regressemos à sua avó, porque ela foi muito importante para si, descobriu através dela o espartilho mas também a costura, a maquilhagem, o mundo das mulheres. O que é que o fascina nesse mundo?

Jean Paul Gaultier:

Eu achei sempre que as raparigas, mesmo na escola, eram muito mais interessantes do que os rapazes, é verdade, com a mesma idade, elas tinham interesses mais próximos dos meus e faziam-me descobrir muito mais coisas que os rapazes que pensavam apenas em jogar futebol, eu sei que digo sempre alguma coisa contra o futebol mas foi isso que aconteceu. Eu sentia-me muito feliz e muito bem com elas e minha avó dava-me total liberdade. Como eu era filho único, eu ficava em casa dela às quintas-feiras, o dia em que não havia escola, e podia ver a televisão que quisesse, até ver coisas que não eram para crianças, que eram proibidas às crianças, eu via todos esses programas. Eu descobri o espartilho, vi as penas negras da ave-do-paraíso: foi fantástico. Descobri um mundo que eu não conhecia e que me fez sonhar.

Euronews:

A sua família é uma família digamos normal…

Jean Paul Gaultier:

Sim, da classe média sa.

Euronews:

Cresceu num bairro social…

Jean Paul Gaultier:

Num bairro social de uma cidade comunista, Arcueil, nos subúrbios da capital, mas podia sonhar, pensar em outra coisa e foi assim que fui enriquecendo o meu mundo de sonho…

Euronews:

E o que é que os seus pais pensavam disso? A sua mãe era caixa, se não estou enganada, o seu pai trabalhava em contabilidade, mas você era uma criança bastante excêntrica.

Jean Paul Gaultier:

Eles não tinham medo. Eles deixavam-me desenhar, eu não andei numa escola de moda. Eu lia as revistas, eu aprendi, de facto, a moda, através da imprensa, descobri-a pouco a pouco. No início era como ler a Bíblia, era preciso questionar aquilo que me estavam a dizer, cada vez mais. Foi assim que comecei a aprender. E eu praticava tentando imitar. Por exemplo, li que Cardin, Pierre Cardin, “apresentou hoje a sua coleção de alta-costura, ele fez 300 modelos”, então em pensei: “bem, vou fazer 301, 302…”. E entrei para a casa Cardin aos 18 anos. Isto porque os meus pais mostraram os meus esboços a um vizinho, cuja ex-mulher era ilustradora da revista “Le Petit Écho de la Mode”, ela viu-os e disse: “Sim é preciso que ele faça algo com isto…”

Euronews:

E enviou-os para Pierre Cardin?

Jean Paul Gaultier:

Para todos os costureiros e recebi resposta de Pierre Cardin, que me contratou no dia em que fiz 18 anos. Fui com a minha mãe, porque tinha recebido um telefonema e eu estava com medo de ir sozinho… Ela esperou-me na entrada do prédio, na Place Beauveau, eu falei com ele, disse-lhe que ainda andava na escola, ele perguntou-me quando é que eu podia vir? Eu disse-lhe, “esta tarde, esta tarde e esta tarde” e ele respondeu-me “tudo bem, está contratado.”

Euronews:

Nos dias de hoje são possíveis histórias como a sua, no mundo da moda?

Jean Paul Gaultier:

Penso que se quisermos podemos.

Euronews:

A sério?

Jean Paul Gaultier:

Sim, penso que as coisas se fazem de outra maneira, é preciso adaptarmo-nos à realidade, agora há a internet, algo que não existia, por isso, as formas de comunicação são diferentes, mas penso que há sempre sonhos possíveis de concretizar. Quando acreditamos, verdadeiramente, penso que amos por uma série de coisas mas que acabamos por conseguir. Penso que o conceito de impossível não é francês.

Euronews:

Trabalha que nem um mouro. Diz-se que tem, todos os dias, uma nova obsessão. Qual é a sua obsessão de hoje?

Jean Paul Gaultier:

Hoje, se quiser, larguei o pronto-a-vestir. Durante 40 anos fiz pronto-a-vestir, muito bem, esse mundo mudou, temos menos liberdade criativa do que tínhamos antigamente, e eu tive oportunidade de conhecer a verdadeira liberdade. Naturalmente que, de alguma forma, eu continuei a tê-la. Mas reformei-me do pronto-a-vestir mas continuarei a nesta profissão e farei outros projetos.

Euronews:

Isso leva-me à pergunta de Patrick Hamon: “Quando é que se vai reformar"> Notícias relacionadas

A experiência musical no jardim zoológico francês tem como objetivo melhorar o comportamento dos animais

Cirurgião francês acusado de violar 300 pessoas condenado a 20 anos de prisão

Tom Cruise regressa a Cannes com Missão: Impossível – O Ajuste de Contas Final